Carta de Outubro critica precarização do trabalho

Emenda que prevê negociado sobre legislado representa retrocesso aos trabalhadores

Nesta segunda-feira (5/10), parlamentares, representantes de entidades sindicais, do Ministério Público e do Judiciário participaram, em Brasília, de audiência pública sobre emenda que prioriza o negociado ao legislado. Aprovada semana passada pela Comissão Mista, que analisou a Medida Provisória 680, a emenda representa um dos maiores retrocessos do mundo do trabalho. De acordo com Ricardo Soares, diretor do Sindicato dos Engenheiros no Estado de Minas Gerais (Senge-MG), a emenda irá, praticamente, “rasgar a CLT”. “Na prática, se aprovada, a emenda irá permitir, que direitos básicos como FGTS, férias e 13º sejam, por exemplo, negativamente alterados por uma convenção ou acordo coletivo, atacando diretamente conquistas históricas dos trabalhadores. Este é mais um instrumento para enfraquecer as forças sindicais do país”, disse Ricardo, que representou a Fisenge. Durante a audiência foi criado o Fórum Nacional de Combate à Precarização e Defesa dos Direitos Sociais, do qual a Fisenge faz parte.

O senador Paulo Paim (PT/RS) fez um apelo ao relator, deputado Daniel Vilela (PMDB/GO), para que retire a emenda da medida provisória. “O senhor é um jovem deputado que vai entrar para história como aquele que rasgou a CLT. A sua emenda faz justamente isso: rasga a CLT. Nem a ditadura militar teve o topete de aprovar o negociado sobre o legislado. Essa emenda é golpe. É o fim da CLT, que foi conquistada a duras-penas pelo povo brasileiro. Não vamos aceitar calados. Vamos mobilizar o Brasil inteiro”, afirmou Paim.

 

 

Leia a íntegra da carta 

 

CARTA DE OUTUBRO – CONTRA A PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO, EM DEFESA DOS DIREITOS SOCIAIS E PELA DERROCADA DO NEGOCIADO SOBRE O LEGISLADO

 

1. Reunidos aos seis dias de outubro de dois mil e quinze, no plenário 2 do Senado da República, com o propósito comum de concertar estratégias para o combate à precarização do trabalho e a defesa dos direitos sociais no âmbito do Parlamento e da sociedade civil, as Entidades abaixo assinadas vêm a público denunciar e externar o seguinte.

 

2.  A Comissão Especial Mista da MP n. 680/2015, incorporando manobra parlamentar abertamente ilegal (artigo 7º, II, da LC n. 95/1998) aprovou no último dia 1/10 o Projeto de Lei de Conversão n. 18/2015, introduzindo no texto da referida Medida Provisória (Programa de Proteção ao Emprego), matéria absolutamente estranha – para a qual serve bem a expressão “jabuti” legislativo – que resgata a proposta de positivar um princípio de prevalência do negociado sobre o legislado.

 

3. Pelo preceito inserido às pressas no relatório do Deputado Darcísio Perondi (PMDB/RS), acrescenta-se novo parágrafo ao artigo 611 da CLT, pelo qual todas as condições de trabalho negociadas pelas categorias econômicas e profissionais passam a prevalecer sobre a lei em vigor, “desde que não contrariem ou inviabilizem direitos previstos na Constituição Federal, nas convenções da […] OIT, ratificadas pelo Brasil, e as normas de higiene, saúde e segurança do trabalho”. A lei trabalhista sai sumamente desprestigiada.  Pelo maquiavelismo legislativo, as portas da precarização abrem-se para a criatividade do capital, ante a disparidade de armas em tempos de desemprego.

 

4. Do ponto de vista jurídico-material, ademais, o texto aprovado não resiste ao mais superficial juízo de constitucionalidade. O novo dispositivo desborda dos limites constitucionais em vigor, ao prever que o negociado possa prevalecer sobre o legislado, desde que não “contrarie” ou “inviabilize” direitos sociais constitucionais, convencionais ou labor-ambientais. Com sentido bem diverso, o artigo 7º da Constituição inaugura o rol de direitos fundamentais dos trabalhadores urbanos e rurais para dizê-los não exaustivos, por não excluir “outros que visem à melhoria de sua condição social”. Neste ponto, a Constituição positiva o que a comunidade jurídica conhece por princípio da norma mais favorável: toda e qualquer instância de normatividade trabalhista — seja a lei, seja a negociação coletiva — deve buscar a melhoria da condição social do trabalhador. É o que decorre, também, do artigo 26 da Convenção Interamericana dos Direitos Humanos, ratificada pelo Brasil, que já obteve, do STF, o reconhecimento da supralegalidade, a tornar inconvencionais, no nascedouro, quaisquer leis que, sem mais, retrocedam na proteção social do trabalhador.

 

5. A negociação coletiva tanto não pode “contrariar” ou “inviabilizar” direitos sociais constitucionais, como tampouco pode deles dispor para, preservando-os na existência, regulá-los de modo menos favorável que a lei vigente. Nesse caso, o comando constitucional é claro: aplica-se ao trabalhador a norma jurídica mais favorável, em qualquer caso, a despeito do que venha a dizer o PLC n. 18/2015, uma vez convolado em lei.

 

6. Como há catorze anos, quando o governo de ocasião pretendia modificar o artigo 618 da CLT para introduzir a prevalência do negociado, é de ingente necessidade que as forças sociais progressistas, incluindo as entidades sindicais, as associações de classe, os movimentos sociais, a academia e a intelectualidade somem forças para, mais uma vez, derrotar o projeto político-econômico neoliberal de um “futuro” que retrocede em dois séculos.

 

Brasília/DF,  6 de outubro de 2015.

 

FÓRUM NACIONAL DE COMBATE À PRECARIZAÇÃO E DEFESA DOS DIREITOS SOCIAIS

CUT – Central Única dos Trabalhadores

UGT – União Geral dos Trabalhadores

NCST – Nova Central Sindical dos Trabalhadores

CTB – Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil

CSB – Central dos Sindicatos Brasileiros

CSP CONLUTAS/GO – Central Sindical e Popular

INTERSINDICAL – Central da Classe Trabalhadora

FST – Fórum Sindical dos Trabalhadores

MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra

MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO

ANAMATRA – Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho

ANPT – Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho

ALJT – Associação Latinoamericana de Juízes do Trabalho

ALAL – Associação Latinoamericana de Advogados Laboralistas

SINAIT – Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho

CSPB – Confederação dos Servidores Públicos do Brasil

CONTRICOM – Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria da Construção e do Mobiliário

CONTRAF/CUT – Confederação dos Trabalhadores do Ramo Financeiro

CONTRACS/CUT – Confederação Nacionais dos Trabalhadores em Comércio e Serviços

FISENGE – Federação Interestadual de Sindicatos de Engenheiros

FITRATELP –  Federação Interestadual dos Trabalhadores e Pesquisadores em Serviços de Telecomunicações

ANFIP – Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil

SINTTEL-DF – Sindicato dos Trabalhadores em Telecomunicações

SENGE/MG – Sindicato dos Engenheiros

 

SINDISERVIÇOS-DF – Sindicato dos Empregados em Empresas de Asseio, Conservação, Trabalho Temporário, Prestação e Serviços Terceirizáveis

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