25/08/2015
Camila Marins/Fisenge
Crise da Petrobrás, intensificação da polarização da política brasileira e atuais medidas econômicas. Estes foram alguns dos pontos abordados pela economista e socióloga Tânia Bacelar, durante palestra realizada no dia 5/3, ao final da reunião do Conselho Deliberativo da Federação Interestadual de Sindicatos de Engenheiros (Fisenge). Antes do início da palestra, o presidente da Fisenge, Clovis Nascimento, alertou: “O Brasil apresenta, atualmente, uma conjuntura delicada. Isso porque o pós-eleição presidencial desencadeou um ferrenho processo de polarização, amplificado pela repercussão da operação Lava-Jato da Petrobrás. Precisamos defender a engenharia nacional e o país”.
Tania Bacelar iniciou sua exposição falando sobre o contexto internacional e suas consequências na economia brasileira. “A crise vem desde 2008 no coração da esfera financeira. Parte da crise, hoje, na indústria vem da abertura comercial e financeira dos anos 1990. Quanto aos países emergentes, ocorreu recentemente (entre 2012 e 2014) uma desaceleração, influenciada em grande parte pela economia chinesa (passa de 10% para 7%)”, afirmou a economista. Um outro ponto importante levantado foi a dívida pública. De acordo com Tania, o impacto da dívida pesa e é duplamente prejudicial. “Com a rentabilidade assegurada com simples aplicação na dívida pública, os bancos deixam de buscar o fomento à economia. Por sua vez, empresas produtivas, em vez de fazer investimentos, preferem financiar o governo”, disse.
2015 já sinaliza que será um ano de ajustes, com previsões convergindo para baixo crescimento do PIB e persistência de inflação ainda alta. Tudo isso acompanhado pelos efeitos econômicos e sociais provocados pela repercussão da Operação Lava-Jato, uma vez que os meios de comunicação intensificam a cada dia uma campanha de desmoralização da Petrobrás, um legítimo patrimônio brasileiro. “É isso que interessa aos produtores e investidores internacionais: querem o modelo de concessão, e não o de partilha. Aécio, durante a campanha, defendeu o fim do regime de partilha e estamos enfrentando o risco de desnacionalização da economia. Há um projeto de desnacionalização do petróleo brasileiro e dos investimentos em infraestrutura. Na ausência das empresas nacionais, serão grandes empreiteiras internacionais. A pergunta é: quem vai fazer? As nossas ou as deles?”, provocou Tania, que foi além: “No pacote de corrupção, temos de enfrentar uma discussão mais profunda. O Brasil não aguenta esse modelo de campanha eleitoral, como é nos EUA, que adotamos desde a democratização do país. Temos que mudar para financiamento público de campanha”, disse.
Ao final, a economista apontou desafios que estão colocados ao conjunto de trabalhadores. Disse que é necessário disputar o ajuste fiscal e promover o debate profundo sobre mudança do sistema tributário; fortalecer e ampliar as políticas de distribuição de renda e aumento do salário mínimo; fazer uma discussão profunda sobre inflação e suas causas; e reduzir/zerar alíquotas dos tributos indiretos. “É preciso que estejamos atentos à delicada conjuntura política interna brasileira e a de outros países, especialmente a América Latina”, acrescentou.
Desindustrialização nacional
A atual crise política no Brasil tem alguns objetivos por parte de setores internacionais e de mercado. Um deles é a desnacionalização da economia, que provoca impacto direto nas indústrias, na geração de emprego e na política de importação e exportação. De acordo com o presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Vagner Freitas, a indústria é um setor de disseminação da tecnologia que impacta na qualidade do emprego e na produção de riquezas. “No Brasil, as maiores conquistas do movimento sindical foram no setor industrial, tanto no que se refere às condições de trabalho quanto à pauta econômica. Portanto, o desaquecimento da produção industrial tem potencial para afetar conquistas históricas da classe trabalhadora, aumentar o desemprego e favorecer o retrocesso das políticas implementadas a partir de 2003 para a redução das desigualdades sociais, como a de valorização do salário mínimo, a primeira a sofrer as consequências da queda do PIB”, ponderou Freitas.
No entanto, é preciso refletir mais profundamente sobre esse processo, uma vez que a desindustrialização advém da desnacionalização da economia. O embaixador Samuel Pinheiro Guimarães explica que a desindustrialização acontece por conta de uma política cambial e monetária que resulta, na prática, na valorização do real, que estimula as importações e prejudica as exportações. “Hoje, o parque industrial brasileiro tem forte presença de empresas internacionais e a atual política de ajuste fiscal vai aumentar essa presença, principalmente no setor de engenharia, construção e bens de capital. Empresas nacionais estão cada vez mais enfraquecidas. Se o Estado brasileiro não compreende que o parque industrial é nacional, irá manter índices de baixa produtividade e competitividade”, comentou Guimarães, alertando para o oligopólio e o monopólio de mercados estrangeiros.
É preciso compreender o processo de desnacionalização como uma lógica perversa, que atinge diretamente a produção e o acúmulo tecnológico do Brasil. “É preciso uma política de disciplina das empresas para a vanguarda da tecnologia. Como fazer com que sejam produtivas e competitivas? Disciplina e normas para estimular empresas de capital nacional. Se não há uma compreensão do que é o parque industrial nacional, há uma visão imperfeita da realidade. Poucas são exportadoras, o que dificulta a competição”, finalizou o embaixador.
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Esse artigo faz parte do Jornal do Engenheiro (nº 186 – ano XVI – julho/agosto de 2015), disponível aqui.