Agamenon Oliveira, diretor do Sindicato dos Engenheiros no Estado do Rio de Janeiro (Senge RJ), representante da base Rio no Coletivo Nacional dos Eletricitários (CNE), saudou a decisão da Justiça do Trabalho que suspendeu as demissões na Eletrobras até abril de 2024, mas alerta que o processo de dilapidação do patrimônio público só será interrompido se o governo retomar o controle administrativo da holding, medida que considera imprescindível para a reindustrialização e a retomada do desenvolvimento no país. Pesquisador do Centro de Pesquisas de Energia Elétrica (Cepel), ele alerta, principalmente, para o esvaziamento da instituição de P&D.
Em entrevista ao programa Faixa Livre (clique para ouvir na íntegra), Agamenon criticou a inação da direção da Eletrobras e do próprio Ministério das Minas e Energia, que deveriam estar buscando novas fontes de receita para o Cepel. O modelo de sustentação do instituto de pesquisa se baseava em repasse de recursos feitos pela holding, mas a lei que privatizou a empresa também estabeleceu que, a partir de 2024, esse total será reduzido em um sexto a cada ano. “Com isso, se não encontrarmos uma alternativa, o Cepel está fadado a desaparecer”, avisa.
A visão privatista, avessa ao risco, é incompatível com o desenvolvimento tecnológico de ponta, explica Agamenon. “O Cepel, para funcionar como sempre fez, desde 1974, precisa de uma fonte de financiamento público. O mercado não vai investir em pesquisa, que, por sua natureza, não tem resultado garantido. É um investimento de risco e maturação lenta, requer um ente público que tenha um interesse mais geral, porque algumas iniciativas não vão dar certo – até chegarmos àquela que funciona e recompensa as outras.“
O CNE programou uma agenda de atos em defesa da empresa e do setor. E também tem tentado debater a questão com a diretoria do centro de pesquisa e com a diretoria da Eletrobras, sem sucesso. “Tentamos também com a Secretaria de Ciência e Tecnologia, mas o Cepel está vinculado ao Ministério das Minas e Energia, e o atual ministro, Alexandre Silveira, tem feito jogo duplo.”
Também por isso, o dirigente destaca a importância do julgamento da ADI 7385, ajuizada pelo governo Lula, por meio da Advocacia-Geral da União (AGU), contra dispositivos da lei de desestatização da Eletrobras que reduziram o poder de voto da União. A AGU sustenta que houve grave lesão ao patrimônio e ao interesse públicos, porque a União manteve cerca de 42% das ações ordinárias, mas não tem voto proporcional a essa participação – mas de apenas 10%. “Uma irracionalidade”, ressalta Agamenon, porque se as decisões tomadas pelos acionistas contrariarem o interesse da empresa, a União vai arcar com a maior parte das perdas.
A ação que suspendeu as demissões foi impetrada pelo CNE e pela Sintergia-RJ (leia aqui) e tentou preservar os empregos até que o STF julgue todos os questionamentos feitos à desestatização. “Esse processo de dilapidação se dá na forma do patrimônio físico – porque a empresa foi subvalorizada na venda – e da mão de obra”, diz Agamenon. “A demissão significa a eliminação da memória técnica, o enfraquecimento e a quebra do poder de resistência dos trabalhadores. Quando diminui a quantidade, diminui a qualidade, quebra-se a espinha dorsal da luta e da empresa. Muito importante essa decisão da Justiça, porque dá um freio, impõe uma resistência.”
Para o dirigente, o governo terá que achar uma maneira de vencer essa batalha, porque, na sua avaliação, “é praticamente impossível” implementar uma série de políticas com a Eletrobras privatizada. “Por exemplo, a reindustrialização pressupõe um setor elétrico com uma política pública para tarifas. Se a Eletrobras for controlada por um grupo de especuladores, como vou fazer política industrial, se a tarifa pode ir nas alturas, para dar mais lucro? Também não dá para fazer política de meio ambiente, se quem controla as usinas e as águas são grupos privados. Será muito difícil para o governo.”
Ele observou que o risco de crise de energia é grave. E lembra que no capital da Eletrobras estão os mesmos grupos que tentam agora devolver a concessão da Light. “O Conselho de Administração da Eletrobras é formado pelo pessoal que participou da privatização da empresa, um processo criminoso e de dilapidação do patrimônio público: não só o valor da empresa foi subvalorizado, como houve sinalizações da diretoria ao aumentar o próprio salário. A presidência passou de R$ 50 mil para R$ 300 mil, e para R$ 200 mil na diretoria. No Conselho de Administração, o conselheiro ganhava R$ 5 mil para participar de uma reunião mensal; agora ganha R$ 200 mil.”
> Entrevista de Agamenon Oliveira ao Faixa