Fonte: O Globo
De acordo com o jornal britânico “The Guardian”, os problemas do Boeing 787 Dreamliner são uma lição sobre a terceirização da produção e “relações muito amigáveis entre reguladores e regulados”. Os 50 Dreamliner atualmente em operação tiveram todos os seus voos suspensos esta semana, por problemas que vão de vazamento de combustível a princípio de incêndio na bateria.
O reitor da Universidade Pace, em Nova York, Amar Gupta, ressaltou ao “Guardian” a complexidade de se terceirizar a produção de um avião, que tem cerca de 2 milhões de peças, contra entre 15 mil e 20 mil de um automóvel. De acordo com o site CNNMoney, 30% das peças do Dreamliner são feitas fora dos Estados Unidos. Os fabricantes estão em Japão, Coreia do Sul, Itália, França, Alemanha, Reino Unido e Suécia.
“Cada empresa fez o que foi pedido, mas houve uma falha na hora de juntar tudo, integrar os sistemas”, disse Gupta ao “Guardian”.
Bateria é alvo de análises
Essa terceirização foi uma das responsáveis pelo atraso de três anos na produção na Dreamliner. Segundo o “Guardian”, “as partes não encaixavam de forma adequada”, e “os calços usados para unir as peças pequenas não foram colocados corretamente”. Além disso, as caudas de vários aviões tiveram de ser refeitas.
Bill Dugovich, diretor de Comunicações da Speea, o sindicato dos profissionais da indústria aeroespacional nos EUA, disse ao “Guardian” que o grupo já havia manifestado à Boeing suas preocupações com a terceirização. “Geralmente, a terceirização estica a cadeia de fornecimento, gera problemas culturais e é muito difícil de coordenar”, afirmou Dugovich. Segundo ele, as partes terceirizadas acabavam tendo de ser consertadas na Boeing.
O jornal britânico ressaltou ainda a força do lobby da Boeing em Washington. O presidente Barack Obama fez uma visita à linha de produção do Dreamliner no ano passado, e em 2010 havia escolhido o diretor-executivo da empresa, Jim McNerney, para presidir o conselho de exportadores.
O “Wall Street Journal” afirmou que, ao liberar o 787 para voar, a Federal Aviation Administration (FAA, órgão regulador do setor aéreo nos EUA) confiou em dados produzidos pela própria Boeing, que apontavam que o sistema de bateria de íon-lítio — jamais usado em uma aeronave grande — era à prova de erro. A FAA, segundo o jornal, normalmente se baseia em dados das próprias fabricantes de aviões.
Essa bateria é outro ponto problemático do Dreamliner. Depois de princípios de incêndio e falhas elétricas, ela se tornou o centro das investigações. Autoridades de EUA e Japão informaram ontem que serão feitos mais testes, que devem levar ao menos uma semana. Foram divulgadas fotos de baterias abertas, queimadas por dentro. O secretário de Transportes dos EUA, Ray LaHood, assegurou que a FAA não vai acelerar seus trabalhos:
— Essas coisas levam tempo. Esses aviões só voltarão a voar quando estivermos 1.000% de certeza de que eles são seguros.
Boeing suspende entregas
A fabricante dessas baterias, a japonesa GS Yuasa Corp., também é fornecedora da Nasa, a agência espacial americana, revelou ontem a agênciaBloomberg News. O porta-voz da Nasa, Josh Byerly, disse à Bloomberg que as baterias a serem fornecidas à agência são diferentes daquela do 787, pois são projetadas especificamente para uso no espaço.
No início da noite, a Boeing anunciou ter suspendido as entregas do 787 até que as falhas na parte elétrica sejam resolvidas. Mas assegurou que a produção não será interrompida. Há 850 encomendas da aeronave.