Fonte: NPC
O governo do Estado do Rio anunciou para esta quinta-feira, 8 de novembro, uma audiência pública para apresentar os termos da concessão do estádio Maracanã. Segundo o projeto oficial, a empresa responsável ficará responsável, por 35 anos, pela gestão, operação, manutenção e readequação do estádio e seu entorno. Cerca de 500 pessoas estiveram no local para protestar contra os planos do Governo. Além da privatização do Maracanã, o projeto também prevê a demolição do estádio Célio de Barros, do Parque Aquático Júlio Delamare, da Aldeia Indígena Maracanã e da Escola Municipal Friedenreich. Entoando vaias e gritos de protesto, militantes sociais, indígenas, torcedores, pais e alunos se viraram de costas e mostraram indignação com a proposta. Gritos como “O Maraca é nosso” e “O Maraca não se vende” eram ouvidos a todo momento.
Gustavo Mehl, do Comitê Popular da Copa, leu ao microfone uma carta coletiva – como mostra o vídeo. O texto afirma que a audiência não é legítima, pois a população do Rio e os principais afetados pela obra não foram consultados. “Exigimos que essa audiência seja cancelada, pois não foram ouvidas todas as partes. Isso fere a nossa democracia”, afirmou, seguido de muitos aplausos. Também disse ser importante a realização de uma nova audiência, para consultar primeiramente se o estádio deve ser privatizado ou não. “É fundamental compreender a importância do Maracanã não como um edifício qualquer, mas como um monumento que carrega parte da memória de nossa gente”, afirmou, explicando porque os presentes discordam da entrega à iniciativa privada. Alguns parlamentares presentes, como os deputados estaduais Paulo Ramos (PDT) e Janira Rocha (PSOL), fizeram coro à manifestação e pediram o cancelamento da audiência. Seguranças à paisana estavam misturados entre os presentes, mostrando a truculência do governo do Estado.
Em entrevista ao NPC, Mehl reforçou que o caráter da audiência pública tem sido invertido pelo governo do Estado. Bandeira histórica dos movimentos sociais, esse momento de participação popular e interferência nas políticas públicas não tem sido respeitado. “O espaço que era para ser de escuta das demandas da população para incorporação e influência nos projetos públicos tem sido usado para o governo expor suas intenções. É um momento usado apenas para legitimar um processo arbitrário e de extrema falta de consulta pública de fato”, afirmou. Ele disse que existe um debate anterior à audiência, sobre o caráter da gestão do Maracanã. “É preciso discutir antes o que a sociedade civil quer do estádio, qual vai ser o uso dos equipamentos. Inclusive é fundamental debater a forma de gestão desse local, se será pública ou privada, e não partir para como será a concessão para a iniciativa privada”.
O militante afirmou ainda que a apresentação do edital de concessão deixa clara a perspectiva de um espaço para entretenimento que pode ser rentável e, portanto, pode ser gerenciado pela iniciativa privada. A vontade da sociedade civil, do grupo de torcedores, da Aldeia Maracanã e de pais e alunos é completamente oposta. “Este é um equipamento de uso social, cultural, esportivo, de lazer, que serve à população e se confunde com a história da cidade. Certamente a visão empresarial do possível concessionário do Maracanã não comporta essa perspectiva de interesse público, já que os interesses de um ente privado na gestão de qualquer equipamento é o lucro”, lamentou.
Privatização do Maracanã faz parte de modelo empresarial de cidade
Ele considera que o descaso com o interesse público não é exclusividade do Maracanã. “De 1999 até agora, vamos ter cerca de R$ 1 bilhão gastos no complexo para ser entregue a uma concessão que, ao fim de 35 anos, vai render cerca de 16,5% do que já foi gasto”. Para ele, se torna clara a certeza de que esse não é um processo de melhoria para a maioria da população. “Tudo isso faz parte de uma perspectiva de cidade que privilegia a possibilidade de ter grandes negócios lucrativos, rentáveis e relativiza direitos constituídos. Isso está claro na reorganização do espaço público, nos processos de remoção que estão ocorrendo em toda o Rio e em outras cidades que estão passando pelo mesmo processo de privatização de estádios públicos”.
Frente a esse cenário, o que resta aos movimentos sociais e a todos aqueles que questionam esse projeto de cidade? “Mobilização popular, pressão, povo na rua. Mesmo sabendo que esse espaço não nos representa, estar aqui para gritar o que queremos de fato, o que esperamos dos processos participativos. E ressaltar que questionamentos toda essa perspectiva empresarial que tem gerido a cidade do Rio de Janeiro”, concluiu.