Instituto Telecom*
O Tribunal de Contas da União deve se referenciar pelo texto constitucional, artigos 70 a 73, mas, tudo indica que a grande maioria dos ministros se esqueceu disso. Aceitaram as pressões eleitoreiras do governo federal e aprovaram um texto inconstitucional que trará enormes prejuízos para a sociedade brasileira. Esta semana voltarão a se reunir apenas para reafirmar o acolhimento das irregularidades.
As impropriedades foram afirmadas num parecer de 270 páginas elaborado pelos técnicos do TCU. Destacamos algumas delas na semana passada: a inviabilidade para entrada de um novo operador; a Anatel considerar apenas 60 municípios economicamente viáveis para o 5G; o uso de recursos públicos da União para custear a instalação de boa parte da infraestrutura necessária para operar em localidades como Brasília, Salvador, São Luís, Porto Alegre, Maceió, Niterói, Uberlândia, São José dos Campos, valores que podem chegar a R$ 25 bilhões de danos ao erário.
O absurdo começou a ser desenhado quando o ministro Aroldo Cedraz, baseando-se no parecer técnico, solicitou vista ao acórdão do ministro relator. Segundo ele, “não poderíamos jamais nos omitir diante das impropriedades apontadas de forma minuciosa pela área técnica”. Cedraz solicitou um prazo de 60 dias para análise, diante da complexidade do tema. Foi negado. Mudou para 30 dias. Negado outra vez. E acabou que o pedido de vista ficou reduzido a uma semana. Absurdo.
Os ministros do TCU, ao que tudo indica, foram guiados pela ideia do ministro das Comunicações, Fábio Farias, que não aceita nenhuma modificação no edital da Anatel e quer tudo aprovado rapidamente. Por quê? Para fazer propaganda eleitoreira. Lançar e implantar o 5G antes das eleições de 2022.
O ministro relator segue um caminho perigoso. Ao invés de exercer o seu papel constitucional, prefere fazer à Anatel apenas alertas e recomendações. Ou seja, a agência acolherá se quiser.
Determinações? Imposições legais? Apenas sobre parcos aspectos como colocar a banda larga nas escolas como uma obrigação. Sabemos – a Anatel sabe e o TCU também -, que essa já é uma obrigação das concessionárias Oi e Vivo desde 2008. Elas não cumpriram, a Anatel não fiscalizou e o TCU coloca outra vez como determinação. Por que não determinar que a agência exigisse o cumprimento por parte das operadoras?
Além de todas as irregularidades apontadas pelos técnicos do TCU, o edital elaborado pela Anatel não trata, em nenhum momento, de questões estratégicas como pesquisa, desenvolvimento tecnológico e nem da cadeia produtiva nacional.
Perde-se, mais uma vez, a oportunidade de fortalecer tecnologicamente o Brasil. Aceita-se a lógica do país como mero importador de tecnologia, fadado a ficar à margem do processo disruptivo (produtos e serviços que criam novos mercados e desestabilizam as grandes corporações concorrentes que antes dominavam determinado segmento do mercado) trazido pelo 5G.
Os ministros do TCU erram e quem ficará para trás será o Brasil. Como disse aquele ex-ministro de triste memória: enquanto olhamos para a pandemia, eles passam a boiada.
* Publicado no portal do Instituto Telecom, em 24 de agosto de 2021