Foto: Michelle Calazans
Conheça os homens e mulheres que estão sem nenhum alimento desde o dia 31 de julho, em greve de fome, pedindo ao STF que restabeleça a Justiça no país – por exemplo, pautando as várias Ações Diretas de Constitucionalidade que questionam as prisões em segunda instância. Debilitados, os sete grevistas estão em camas hospitalares, deslocando-se em cadeiras rodas. Mas determinados a resistir. O mais jovem é o estudante Leonardo Soares, com 22 anos. E o mais velho, Luiz Gonzaga da Silva, tem 69.
. Leonardo Soares
Aos 22 anos, o estudante Leonardo Soares é o mais jovem entre os sete militantes na “Greve de Fome por Justiça no STF”. Participa do Levante Popular da Juventude desde 2015. Foi durante um evento realizado pelo Diretório Central da Universidade Federal de Sergipe que conheceu o Levante, durante uma ação crítica de “descomemoração” pelos 50 anos da Rede Globo. Hoje, sua tarefa no movimento é apoiar os secundaristas do seu estado em Alagoas. Filho único por parte de mãe, Soares foi criado pela família materna. A avó, dona Marli é “Lula até a morte”, segundo ele. A casa de sua família foi conquistada graças ao programa Minha Casa Minha Vida. “Eu vim de uma família de classe média baixa e vi as mudanças ocorrendo na minha vida com os governos progressistas. Eu pude ver com meus olhos a transformação do Brasil”, diz Leonardo. “O que me atraiu para o Levante foi sua ação política concreta e acho que isso é o que atrai tantos os jovens para essa organização.” A maior preocupação do estudante em relação ao golpe é o aniquilamento enquanto força política da esquerda organizada, mas também das pessoas, num país que viveu há pouco tempo a ditadura militar. “Esse é o maior medo de todo militante”, disse. Também destaca o aumento da pobreza, da população em situação de rua e da violência. Aderiu à greve de fome seis dias depois do seu início.
. Rafaela da Silva Alves
Com 31 anos, Rafaela da Silva Alves é pedagoga, atriz, e camponesa, como ela mesma se define. Está há sete anos na organização dos trabalhadores e trabalhadoras rurais do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), onde integra a direção nacional. “Eu nasci em Sergipe, em um município chamado Poço Redondo, em uma comunidade chamada Maranduba, onde eu vivo até hoje. Meu pai é pernambucano e minha mãe alagoana, mas se encontraram em Sergipe. Quando eu tinha 12 ou 13 anos, a gente começou a fazer um trabalho ligado à igreja, na perspectiva da Teologia da Libertação. Um trabalho de organização de grupos de jovens. Nesse trabalho, a gente construiu um grupo de teatro chamado Raízes Nordestinas. Esse grupo existe até hoje. Foi por esse grupo que a gente conheceu o MPA. Nossa arte sempre foi muito política, com o compromisso de refletir a realidade”, relembra. Em sua região, ela afirma que cerca de 1.500 famílias foram cortadas do Bolsa Família, no contexto da seca que atingiu a produção agrícola local e da interrupção de políticas para o semiárido como a construção de cisternas e bancos de sementes, após o golpe de 2016. “Hoje a gente já vê um número muito grande de pessoas batendo nas portas, passando e pedindo alimento. (…) Eu tenho uma tarefa como jovem, mulher, nordestina, sertaneja e camponesa. Eu quero dar minha contribuição para mudar esses rumos.”
. Jaime Amorim
Jaime Amorim é integrante da Direção Nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e representante da América do Sul na Coordenação Internacional da Via Campesina. Tem 58 anos, quatro filhos e um neto. Iniciou a militância em 1979, em uma comunidade eclesial de base, onde passou a integrar a Pastoral da Juventude em Guaramirim (SC). Formou-se em Pedagogia e, sem abandonar o trabalho na roça, ingressou na Comissão Pastoral da Terra. Em 1985, participou do primeiro Congresso do MST. Em meados de 87, deixou o Sul do país com a tarefa de construir o MST no Nordeste, passando pela Bahia, por Alagoas, Sergipe, Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte. A partir de 1992, fixa-se em Pernambuco, estado da primeira ocupação do movimento, em 1989, com a participação de Amorim. Nos anos 2000, Amorim escreveu “Da Esperança à Frustração”, parte de uma pós-graduação da UFJF, com críticas ao governos do PT, marcados, segundo ele, pela inclusão social e melhoria das condições de vida mas sem o paralelo avanço da organização popular. Mas as críticas não o impedem de defender com a própria vida, até o limite de uma greve de fome, a liberdade de Lula. Agora, Amorim pensa que é possível ir da frustração a uma nova esperança, ou seja, que um próximo governo de Lula – enquanto “instituição e aquilo que representa para o povo brasileiro” – possa enfrentar as razões estruturais dos problemas do país. “Nós sofremos um processo de frustração, sofremos o golpe [de 2016] e passamos a reconhecer que parte daquela política era importante para os trabalhadores e agora é a nova esperança, de que ele possa revogar tudo que foi feito durante o golpe e fazer tudo aquilo que não foi feito”, defende.
. Vilmar Pacífico
Militante do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) no Paraná, Vilmar foi operário no ABC paulista até se aposentar, inclusive no auge das mobilizações operárias lideradas por Luiz Inácio Lula da Silva. Tornou-se então sindicalista, em São Bernardo do Campo. Por meio de um sobrinho, Pacífico conheceu o MST há cerca de dois anos. Nascido em São Miguel do Iguaçu, interior do Paraná, voltou ao seu estado de origem para viver no acampamento Fidel Castro, localizado em Centenário do Sul. “Fui a São Paulo em 79. Peguei todas essas greves. Peguei a greve da Ford de 42 dias. Foi onde vivi até me aposentar. Em 2009 eu larguei a Ford. Convivi muito tempo com o sindicato, o pessoal tudinho da CUT. Fui membro de comissão de fábrica”, recorda. O ex-metalúrgico afirma que a greve de fome é uma denúncia à situação do país, marcada pela volta da fome e da miséria. Para sair do “caos”, ele acredita na eleição de Lula. A prisão do pré-candidato do PT, para ele, segue o mesmo padrão de perseguição sofrida pelo então líder sindical e se trata de “uma jogada para tirar ele das eleições”. “Em 79 ou 80, lá na Vila Euclides, na porta da Ford, o Lula foi chutado e esmagado pela polícia. Levou várias borrachadas. A causa dele sempre foi defender o povo brasileiro. O que ele tá fazendo, e está pagando por isso, é o prosseguimento daquilo. A gente sempre pensava que o Lula poderia ser nosso presidente. Eu me admirava muito e me admiro até hoje”, defende.
. Luiz Gonzaga da Silva, Gegê
Luiz Gonzaga da Silva, o Gegê, tem 69 anos e integra a Central de Movimentos Populares (CMP). Nasceu no interior da Paraíba e conheceu cedo a repressão. “Quando tinha entre 13 e 14 anos, estava chegando em casa e a polícia prendendo meu pai. A partir daquele dia me juntei à luta. Meu pai era filiado ao sindicato dos trabalhadores rurais na cidade de Catolé do Rocha. Sou filho de camponês e camponesa.” Ainda na Paraíba, ele militou em organizações clandestinas de resistência à Ditadura Militar. Em 1969, foi preso duas vezes. Em 1974, foi para São Paulo, onde se integrou ao movimento popular urbano, reivindicando moradia digna na região central da cidade. Morou e trabalhou em uma empresa da construção civil na Vila Olímpia. “Vi a primeira favela de São Paulo ser queimada. Passei a ter o entendimento de que era um fogo criminoso. No outro dia, transferiram todo aquele povo no bairro do Morumbi, onde se tornou aquela grande favela que é Paraisópolis. Eu não fui. Fui morar em cortiço. A partir dali, comecei a me meter na luta da moradia digna no centro da cidade de São Paulo”, lembra. Já nos anos 2000, Gegê foi alvo de um novo processo judicial, sob falsas acusações que, ao final do processo, o Ministério Público reconheceu serem infundadas. Como ex-preso político em mais de uma ocasião, como migrante nordestino, Gegê vê no processo contra Lula a mesma perseguição sofrida por tantos outros militantes.”Lula está sendo um preso político. Não tenho dúvida. Não estão prendendo [apenas] Lula, estão prendendo a classe trabalhadora, todos nós que lutamos por direitos.”
. Zonalia Ferreira
Mãe de oito filhos e avó de sete netos, Zonalia nasceu no Mato Grosso do Sul, mas vive em Rondônia há mais de 30 anos. “Sou camponesa e filha de camponês nordestino. Eu fui para Rondônia em 1987. Estou na luta junto ao MST desde os anos 90. Eu sempre fui camponesa. No Mato Grosso do Sul, os fazendeiros foram imprensando até que meu pai teve que vender o restinho de terra que a gente tinha”, diz. Na madrugada de 25 de julho de 1990, participou de sua primeira ocupação de terras improdutivas. Após rodar o estado “de despejo em despejo” – quatro no total – ocupou o local onde hoje vive. Depois de dois anos, em 1992, se tornou assentada da reforma agrária mas continua participando do Movimento até hoje. O assentamento Madre Cristina, onde vive, se localiza no município de Ariquemes (RO), em região historicamente marcada por conflitos fundiários. Com o fim das obras da hidrelétrica de Santo Antônio e o aumento do desemprego, o lugar enfrenta ainda maior violência social. “Foi uma opção minha vir para a greve de fome. Meus netos e filhos são assentados e tem a terra para produzir. Minha preocupação é pelos outros que não têm”, diz.
. Frei Sérgio Antônio Görgen
O jovem Sérgio Görgen começou a participar de grupos de jovens da igreja católica aos 14 anos. Hoje, aos 62, o Frei Sérgio é dirigente do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA). Sua atuação política se iniciou na época da ditadura militar. No seminário franciscano, presenciou muitos freis sendo perseguidos, com relatos de tortura. “Naquele período o Judiciário não se envolveu com a perseguição, muitas vezes era o lugar da proteção. A ação era da direita mais violenta e da polícia e do Exército. Era muito diferente de hoje, não tinha essa amplitude social que se criou com a onda fascista de hoje”, compara. Depois disso, foi uma vida dedicada às lutas rurais e por terra. Neste contexto, Frei Sérgio coleciona cinco greves de fome. Sobre a última, o Frei ressalta que não se trata de defender um partido ou grupo político específico. “Partido nenhum e candidatura nenhuma me faria fazer uma greve de fome, nenhuma. Agora, a situação caótica e desgraçada do povo me anima a fazer greve de fome. E é evidente que a solução dos problemas do povo passa pela política, e passa pelo Lula. Ele se tornou o símbolo e uma possibilidade de retomar a esperança do povo”. Em dezembro de 2017 ficou dez dias em greve de fome contra a reforma da Previdência. Sobre o medo da greve de fome, o Frei afirma sempre existir, mas a vontade de romper a inércia é maior. A primeira greve foi realizada em 1989: ele e mais cinco companheiros resistiram 16 dias até conseguirem a posse de um loteamento. “Hoje eu moro num assentamento conquistado naquela greve de fome”.
FOTOS: com exceção da foto do Frei Sérgio, que é de seu arquivo pessoal, todas as demais são creditadas a Nacho Lemos/TeleSur
Fonte: Com informações do Brasil de Fato (BDF) –
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