Fonte: Brasil de Fato
O governo golpista de Michel Temer (MDB) quer permitir que até 40% do ensino médio seja realizado à distância (EAD). Para a educação de jovens e adultos (EJA), a proposta é de que todo o curso seja fora da escola. A resolução, fruto da reforma do Ensino Médio, aprovada em 2017, foi discutida no Conselho Nacional de Educação (CNE) e atualiza as Diretrizes Curriculares Nacionais do Ensino Médio.
Para Maria Raquel Caetano, pesquisadora e doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), o governo federal apresenta um discurso de inovação, eficiência e redução de gastos, mas a ação, no entanto, é uma “tentativa de privatização do ensino público e aprofundamento das desigualdades sociais”. Segundo ela, essa é uma estratégia para não enfrentar os grandes problemas do ensino médio, como a evasão escolar e a carência de professores e infraestrutura básica.
“Ao mesmo tempo em que a PEC 55 congela por 20 anos o investimento público nas áreas sociais, em especial na educação, isso é perfeito para a narrativa do governo de repassar as políticas sociais para o setor privado”, afirma.
Maria Raquel aponta um esvaziamento do conteúdo educacional do ensino público, o que, segundo ela, dá margem para a precarização de um direito básico. “A oferta permanece pública, mas as instituições privadas operam por dentro das escolas, interferindo na gestão e no currículo, que é o coração do ensino e que pauta a formação do sujeito. Portanto, a proposta de formação cidadã é deixada de lado e entra a formação para o mercado, precarizado também pela reforma trabalhista”.
O coordenador geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel Cara, destaca que o sucateamento do ensino público também pode se dar pela proposta de substituição de professores por tutores. Para ele, o direito à educação no Brasil está em risco quando o governo federal apresenta subterfúgios que precarizam uma etapa fundamental para a construção da autonomia dos estudantes.
“A questão central é uma tentativa de precarizar os direitos sociais e a educação tem sido o mais atacado, porque, depois da previdência, é o direito social que mais tem custos, que mais representa necessidade de investimento”, diz.
Roberto Catelli Jr., coordenador executivo da Ação Educativa, ressalta que a proposta de educação integral à distância para o EJA não será inclusiva, porque o modelo não atende a necessidade da maior parte dessas pessoas. “Tornar a educação de jovens e adultos 100% à distância dificilmente será um benefício, porque essas pessoas precisam de acompanhamento presencial e estímulos para estudar. Não será um modelo à distância que irá trazê-los de volta para que o direito à educação seja de fato efetivado”.
Por isso, Maria Raquel defende uma educação pública com qualidade social. “Por um lado, isso explica também o esvaziamento na formação de professores, especialmente na área social e humana. Isso é gravíssimo para a educação e para a formação de uma sociedade mais justa, igualitária, humana e comprometida com os valores cidadãos”.
Sobre a proposta, a pesquisadora diz que falta diálogo com os personagens mais importantes: alunos e professores. Ela conta que as entidades e instituições da categoria não foram consultadas. “Definitivamente, nós precisamos compreender que a educação de qualidade social se faz com investimento público, para o público e com o público. Nós precisamos avançar na gestão democrática, que não tem sido um princípio utilizado pelo governo ao priorizar a interlocução apenas com os empresários”.
O processo sobre a resolução de ensino à distância deve ocorrer ainda neste semestre. Após a definição das diretrizes, caberá a cada rede de ensino regulamentar formatos e ferramentas educacionais.