Por: Paulo Jager – Dieese
A economia brasileira atravessa um dos períodos mais críticos de sua história. Após oito trimestres de queda no PIB, acumulando uma retração de 7,2% nos anos de 2015 e 2016, a atividade econômica não dá mostras consistentes de reação e provavelmente teremos, em 2017, um ano de estagnação ou muito baixo crescimento, com nova queda no PIB per capita.
Frente a desequilíbrios macroeconômicos, em boa medida de caráter conjuntural e em parte provocado por choques externos, como a queda no preço das commodities, respondeu-se com a contenção do gasto público e a elevação dos juros, entre outras medidas de arrocho, já a partir do ano de 2015.
Adicionalmente, fez-se algo muito mais grave em 2016. Por meio de uma emenda à CF-88, governo Temer e Congresso abandonaram as metas de resultados das contas públicas e fixaram por 20 anos as despesas[1] da União. Algo sem similar em outros países.
Estas e outras medidas buscando a denominada “consolidação fiscal” visavam convencer a sociedade de que o controle do gasto público permitiria ao governo equilibrar as suas contas de forma estrutural. A crença no ajuste levaria ao resgate da confiança dos empresários que, por sua vez, capitaneariam uma retomada da atividade econômica por meio da realização de novos investimentos – para os críticos, esse raciocínio não passa de uma crença na ”fadinha da confiança”.
Todavia, a realidade se impôs. A situação fiscal agravou-se, não por uma explosão de gastos, que a rigor não ocorreu, como se percebe no gráfico, mas por uma queda sem precedentes da receita fiscal, em razão da recessão que o país atravessa, em boa medida intensificada pela própria redução no gasto público, alimentando um círculo vicioso que fez crescer muito a relação dívida pública / PIB no país – estima-se que a mesma alcançará os 100% nos próximos anos.
A ortodoxia na política econômica implementada deve-se a uma visão dogmática que sequer vem sendo defendida por insuspeitos organismos internacionais. Técnicos do FMI, já no início de 2016, divulgaram um artigo questionando abertamente esta, dentre outras “verdades” da agenda neoliberal.
Segundo os mesmos, não há evidência empírica de que os processos de ajuste fiscal são sucedidos por crescimento econômico. Ao contrário, constatou-se que há um aumento importante na desigualdade social e que este, por sua vez, resulta em impactos negativos no nível e sustentação do crescimento.
A experiência portuguesa é um bom exemplo do fracasso dessa estratégia. O país, que em 2010 (até 2014) adota uma rígida política de ajuste fiscal, mergulha em nova crise recessiva em 2011 e, além de experimentar uma explosão do desemprego (que chegou a 17%), vê sua relação dívida pública / PIB subir significativamente (até atingir cerca de 130%).
A partir de 2015 um novo governo, liderado pelo Partido Socialista, revê completamente esta política e adota medidas que procuram aumentar a demanda agregada e promover o crescimento econômico, dentre elas, o aumento do gasto público.
Já em 2016, a economia volta a crescer, o déficit fiscal cai à metade e, o mais importante, salários, pensões e nível de emprego retornam a seu patamar anterior à crise de 2008.
E nós? Seguimos firmes em nossa insana trajetória, na contramão das evidências e da compreensão que se generaliza do que deve ser feito para enfrentar a crise. Não fosse o bastante, o governo federal acaba de enviar ao Congresso Nacional o projeto de lei orçamentária para o ano de 2018. O que se vê ali é trágico. Os cortes nas áreas e programas sociais são próprios de um “austericídio”.
Nessa batida, além de não sairmos deste atoleiro econômico, aprofundaremos ainda mais nosso quadro de iniquidade social.
É preciso, portanto, combater vigorosamente pela alteração da proposta de lei orçamentária bem como lutar para, num futuro próximo, abolir o insustentável novo regime fiscal. As consequências de não fazê-lo podem ser terríveis para o povo brasileiro.
[1] As despesas com o pagamento de juros da dívida aos rentistas não são abrangidas pelo congelamento.