Por Samantha Su
O plano de ataques do Governo Michel Temer aos direitos constitucionais continua a todo vapor. Dessa vez, os alvos são a Lei Geral das Telecomunicações e o Marco Civil da Internet. Através do Projeto de Lei da Câmara nº 079, de 2016, conhecido como o “PL das Teles”, as empresas de telefonia não vão ter o que reclamar da crise. A receita do PLC é perfeita para a entrega do patrimônio à iniciativa privada: estabelece menos obrigatoriedade com o serviço público combinada com a anistia dos bens reversíveis, calculado em bilhões.
A iniciativa vai repassar de graça para as operadoras de telefonia, nada menos que R$100 bilhões em bens reversíveis da União. Ou seja, trata-se de toda infraestrutura, tais como redes de cabo de cobre e fibras ópticas, dutos subterrâneos, centrais de controle, imóveis etc, que é cedida pela União enquanto durar o período de concessão, necessária à continuidade e prestação dos serviços. Segundo a Lei Geral de Telecomunicações, de 1997, esses bens devem retornar para que o governo possa fazer nova licitação, ao fim da concessão, em 2025. O que propõe o PLC 079 é que o regime de concessão se modifique para o de autorização, passando a infraestrutura para o controle das empresas. Toda a responsabilidade com a garantia do serviço público será resguardada por autorizações da Anatel. Órgão que, através de seu presidente, Juarez Quadros, tem constantemente demonstrado alinhamento ao projeto.
Mobilização tenta resistir às irregularidades do projeto
O congresso parece querer aprovar às pressas o PLC 79/16. O projeto, de autoria do deputado Daniel Vilela (PMDB-GO), chegou ao Senado em 30 de novembro e lido no mesmo dia em plenário, foi remetido à Comissão Especial de Desenvolvimento Nacional (CEDN). O parecer saiu no dia seguinte e, em 6 de dezembro, o Projeto foi aprovado sem discussão no plenário. Os senadores Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), Paulo Rocha (PT-AM) e José Pimentel (PT-CE) entraram com recurso pedindo para que o projeto, que modifica o legislativo, seja ao menos discutido em plenário no início do ano de 2017. O recurso está agora nas mãos do Supremo Tribunal Federal (STF), que deverá julgar se a votação foi legítima.
Diante da situação, diversos movimentos sociais, dentre eles o Clube de Engenharia, Intervozes, Barão de Itararé e outros, entraram com o pedido no Ministério Público Federal (MPF), de um Inquérito Civil Público para apurar as irregularidades na aprovação do documento pelo Senado.
Caso da Oi
Se o PLC mostra cada vez menos ter algum interesse público, seu interesse privado pode ser esclarecido com a crise que passa hoje a maior empresa de telefonia fixa do país. A alteração na lei poderia favorecer o mercado para a venda da Oi, que em um ano acumulou R$10 bilhões em prejuízos e uma dívida de R$65 bilhões ao todo. Se em 2013, o TCU declarou que os bens reversíveis estariam em R$105 bilhões, metade disso (R$51,9 bilhões) está sob domínio da Oi e será anistiado com o fim da concessão.
A falsa representatividade da Anatel
A Anatel, agência que deveria se comprometer com a regulamentação do serviço de telecomunicação, não é um bom exemplo de fiscalização. Segundo Marcio Patusco, presidente do Conselho Consultivo da Anatel como representante da sociedade civil, a agência chega a tratar o PLC 079 como consolidado. “Nós tínhamos uma única reunião marcada para agora dia 18 de janeiro, íamos discutir exatamente o plano geral de metas de universalização que foi todo baseado na lei nova, que não está sequer sancionada. Isso é uma irregularidade tremenda. Não há legitimidade nesse plano, assim como não há no plano geral de outorgas, baseado também no PLC 079”, declarou Patusco.
Juarez Quadros, presidente da Anatel, cancelou as reuniões alegando problemas de verbas por não terem ainda aprovado as despesas desse ano. “Ele não quer se expor, porque ele vem defendendo reiteradamente essa iniciativa e não quer enfrentar a oposição”, opina Patusco. O problema da representatividade é ainda mais grave, pois em 16 de fevereiro o mandato dos representantes da sociedade se extingue e não há convocação para substituição. “O pior desse cenário é que está em tramitação no Congresso o que chamamos do PL das Agências Reguladoras. Isso irá retirar a representatividade da sociedade nos conselhos consultivos e transferir isso para o legislativo. Em suma, vão acabar com os conselhos”, explica o presidente do Conselho. O risco de não haver novas eleições e burocratizar ainda mais a representação das agências reguladoras torna cada vez mais fácil a exploração do serviço sem nenhum tipo de fiscalização.