Por Instituto Telecom/Coalizão Direitos na Rede
Nota elaborada pela Coalizão Direitos na Rede sobre a representatividade da sociedade civil:
“As organizações que subscrevem esta nota vêm manifestar sua preocupação e solicitar atenção em relação à distorção do caráter democrático, representativo e multissetorial do Conselho Gestor do FUST. Observamos com inquietação a candidatura selecionada (P&D Brasil – Associação de Empresas de Desenvolvimento Tecnológico Nacional e Inovação) para ocupar a vaga destinada à sociedade civil, pois esta acaba por representar interesses predominantemente comerciais do setor empresarial e não o interesse público e representativo dos sujeitos de direito da sociedade, que estaria garantido em outras candidaturas que se apresentaram.
A indignação é ainda mais justificada ao sabermos que coalizões e entidades como a Coalizão Direitos na Rede, a Campanha Nacional pelo Direito à Educação, a Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos – CONAQ e a Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd) também enviaram e apoiaram candidaturas da sociedade civil representativa e, mesmo assim, o Ministério das Comunicações optou por escolher uma entidade do setor empresarial para ocupar a vaga destinada à sociedade civil, restringindo a representatividade que deveria ser garantida à vaga de forma não somente quantitativa – já que o setor empresarial representa um percentual muito menor da população que os sujeitos de direito das políticas – quanto qualitativa – já que o interesse público deve imperar sobre o privado, especialmente em órgãos de Estado.
Destacamos que esta situação desvirtua o propósito multissetorial do Conselho Gestor do FUST, ao representar instituições de natureza nitidamente empresarial, utilizando-se das características dessas organizações para apresentar-se como representantes da sociedade civil. Tal procedimento configura-se como um desvio de finalidade e um possível conflito de interesses diante dos objetivos estatutários dessas organizações, comprometendo a legitimidade do processo de indicação e, consequentemente, da nomeação pelo Ministério das Comunicações. Vale ressaltar que tais entidades possuíam como opção a candidatura a partir de editais próprios dos setores em que poderiam concorrer com seus pares.
Há que se reconhecer que não há paridade de recursos entre setor empresarial e sociedade civil representativa dos sujeitos de direito. Esta última detém muito menos recursos de todas as sortes para defender os interesses dos cidadãos e cidadãs brasileiros, que são não só maioria como os principais sujeitos de interesse das decisões do FUST. Espaços de participação e representação como o Conselho Gestor do FUST são essenciais para garantir alguma voz da sociedade civil representativa em espaços decisórios. Por isso, é preocupante que nem esses espaços estejam devidamente salvaguardados.
É devido ao caráter público dos recursos do FUST e da histórica participação da sociedade civil nos debates sobre o fundo que é relevante destacar a importância da gestão democrática e da participação social nas instâncias de deliberação e aprovação das diretrizes dos projetos, das linhas de financiamento e de outros temas relacionados à aplicação dos recursos, incluindo a defesa dos princípios de transparência, ampla publicidade e diversidade do Conselho Gestor.
Lembramos que este não é o primeiro problema com editais de convocação para representantes da sociedade civil. Em 2022, o Ministério das Comunicações publicou, no Diário Oficial da União, a lista dos profissionais que integrariam o Conselho Gestor do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (CG-Fust). Observamos, com preocupação, a inclusão de indivíduos diretamente vinculados ao agronegócio nacional nas vagas destinadas à sociedade civil, especificamente representantes do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural, vinculado à Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). Ressaltamos que, das seis indicações feitas pela Coalizão Direitos na Rede, nenhuma foi selecionada. Diante do exposto, solicitamos encarecidamente que o Ministério das Comunicações considere a nulidade da inclusão de representantes alheios à sociedade civil para as vagas deste setor, tendo em vista o descumprimento dos requisitos dos editais, desvio de finalidade e conflito de interesse que desvirtua as bases multisetoriais que fundamentam a atuação do Conselho Gestor do FUST.
Alertamos também para o risco iminente de uma eventual anulação judicial do ato de nomeação caso a vaga da sociedade civil seja ocupada por representante do setor empresarial, o que contraria a essência e os princípios do Conselho Gestor do FUST.
Acreditamos no compromisso das autoridades públicas com a preservação dos valores democráticos e do Estado de Direito, e confiamos que medidas serão adotadas para assegurar a representatividade legítima da sociedade civil no Conselho Gestor do FUST.
Certos de que nossos pleitos serão tratados com a devida atenção, colocamo-nos à disposição para prestar quaisquer esclarecimentos adicionais que se façam necessários.
OBS: A Nota na integra está disponível em direitosnarede.org.br/
Instituto Telecom, Terça-feira, 13 de agosto de 2024
Foto: Zack Stencil/MCom