Brasília, 2019 – Foto: Marcelo Camargo/Ag. Brasil
Associação dos Empregados da Eletrobras (AEEL)*
Em 2018, a Eletrobras lucrou R$ 13,3 bilhões. Deste montante, foram distribuídos R$ 1,25 bilhão de dividendos, e R$ 2,29 bilhões foram destinados à constituição de reserva especial de dividendos.
A participação pública no capital social da Eletrobras é composta pela União, com 51% do capital social das ações ordinárias, 13,04% do BNDES e 6,86% do BNDESPAR, somando 71% das ações com direito a voto. O BNDES e o BNDESPAR possuem ainda 7%, cada um, das ações preferenciais. Em 2018, somente a União recebeu aproximadamente R$ 450 milhões de dividendos da Eletrobras, e espera receber cerca de R$ 1 bilhão provisionados a título de ,dividendos não distribuídos.
Já em 2019, a Eletrobras registrou lucro de R$ 10,7 bilhões, e está propondo distribuir 25% do lucro líquido ajustado, percentual mínimo definido pela Lei das S.A.. Ou seja, os dividendos propostos são da ordem de R$ 2,5 bilhões, o que fará com que a União receba pouco mais de R$ 1 bilhão em 2020 referentes ao resultado de 2019.
Ademais, o estatuto social da Eletrobras prevê que a empresa reserve 50% de seu lucro líquido para fins de investimento. Em 2018, foram reservados R$ 6,6 bilhões e, em 2019, R$ 5,3 bilhões. Ou seja, nos dois últimos anos, a Eletrobras reservou aproximadamente R$ 12 bilhões para investimento. Essa reserva permite à empresa realizar um papel importantíssimo em meio a esta crise econômica e social que o Brasil e o mundo estão enfrentando. É importante destacar o papel do investimento público sobre o investimento privado, principalmente em cenários econômicos recessivos ou catastróficos, como o que se desenha.
A Eletrobras, como empresa pública, além de ser uma excelente fonte de recursos para o Governo Federal em um momento fiscal delicadíssimo, está pronta para cumprir um papel crucial na economia brasileira. Atualmente a Eletrobras está em condição econômico-financeira bastante favorável, com situação de caixa formidável e baixo nível de endividamento. Está preparada para alavancagens financeiras necessárias para financiar investimentos estruturantes para o setor elétrico nacional, sem falar que possui uma capacidade multiplicadora de investimento que permeia toda a economia, [sendo] portanto, uma excelente opção para investidores e demais agentes econômicos.
Para se ter uma ideia, de acordo com as demonstrações contábeis da Eletrobras, a empresa encerrou o ano de 2019 com um caixa aproximado de R$ 10,8 bilhões. No cenário atual, caracterizado por uma incerteza gigantesca, em que as expectativas dos agentes econômicos privados estão extremamente pessimistas, o Estado tem o dever de promover iniciativas que amenizem o ciclo recessivo que está por vir. O Estado tem a obrigação funcional de criar e fomentar projetos estruturantes que movimentem a economia, utilizando para isso os governos, bancos públicos e suas empresas públicas e estatais, atuando como indutores da manutenção e aumento dos investimentos privados. Dessa forma, a manutenção da Eletrobras como uma empresa pública representa um importante instrumento de política econômica a ser utilizado pelo Governo na potencialização dos investimentos na retomada econômica.
Não podemos, também, deixar de falar da posição do presidente da Eletrobras nesse momento, que reforça o discurso da privatização da Empresa a qualquer custo, colocando, inclusive, a privatização como meta em seu documento oficial de planejamento estratégico. O argumento é sempre o mesmo: a Eletrobras não tem capacidade de investimento, como divulgado recentemente na mídia (Valor Econômico de 14/04/2020).
Wilson Pinto Junior está na contramão da história, minimiza as potencialidades da Eletrobras como empresa, vende a ideia de que ela não tem condições para tocar investimentos estruturantes, transformando uma gigante numa pequena e incipiente empresa, tudo isso para justificar o injustificável e tentar iludir a sociedade para vender um dos maiores conglomerados de empresas do setor elétrico mundial a preço de banana, num momento de alta volatilidade dos mercados e moeda americana nas alturas, sem falar das incertezas econômicas que virão pela frente.
Em reportagem recente, um dos donos do Grupo 3G Radar declarou que gosta de momentos de crise, pois vê neles riquíssimas oportunidades. Ele fala com propriedade, ainda mais contando com o servilismo de gestores públicos com comportamentos distorcidos e que trabalham para entrega do patrimônio público na bacia das almas.
Está mais do que claro que o projeto de privatização da Eletrobras foi feito sob medida aos interesses do 3G Radar, que manda e desmanda dentro da Empresa, uma aberração e improbidade sem tamanho que mais cedo ou mais tarde responsabilizará os atuais dirigentes.
Que empresário ou grupo não quer comprar uma empresa prestadora de serviço público essencial, produtiva e saneada, por alguns dólares, e ganhar de partida a triplicação das tarifas? Como disse um dos 3G, uma belíssima oportunidade pós-crise ou, no dito popular, um negócio da China!
Na verdade, é um famigerado e pernicioso projeto que começou em 2016 e está todo estruturado em cima do aumento das contas de luz e elevação de impostos para a população – um verdadeiro assalto aos bolsos dos consumidores e um crime lesa-pátria.
Com um discurso depressivo e calculista, em meio a uma crise econômica sem precedentes, o presidente da Eletrobras vem prejudicando drasticamente os preços dos ativos da empresa que administra, frustrando qualquer expectativa de demanda futura, o que é, no mínimo, criminoso. Primeiro por seu aspecto legal, notoriamente sendo violado pela Alta Administração da Eletrobras (Diretoria Executiva e Conselho de Administração), já que a Eletrobras é uma empresa pública, cuja privatização é proibida por lei. Segundo, pelo grande mal que causa à sociedade e à economia.
Falar em privatização agora, em um modelo que aumenta significativamente a tarifa de energia elétrica é (i) retirar do País um poderoso instrumento de geração de renda que permeia toda a sociedade; (ii) é condenar empresas à falência, pois compromete ainda mais sua recuperação; (iii) é condenar milhões a passarem por mais dificuldades, o que em muitos casos levará à desagregação familiar; (iv) é retirar mais dinheiro do bolso do povo brasileiro, fundamental para sua sobrevivência; (v) é ser o mais perverso e sádico possível, pois transfere esses recursos retirados do bolso de cada cidadão para as mãos de meia dúzia de endinheirados que vão gastá-lo no exterior e especular ainda mais em Bolsa.
É notório e lógico que as empresas privadas se movem por suas expectativas de lucro. Elas pertencem, de fato, a investidores (grupos e famílias) que esperam retorno de seus investimentos. Entretanto, sem expectativa de demanda, não haverá investimento e, consequentemente, geração de empregos. Cabe lembrar que se analisa o Investimento no macro, mas ele se forma pelo conjunto do micro. É questão de pesquisa de mercado, sem demanda, não se toma a decisão de investir na economia real. Então, quanto mais o Brasil arrocha a demanda via redução de salários e benefícios (que é, de fato, salário indireto), empregos formais e estáveis, redução ou sucateamento dos serviços públicos, aumento de tarifas de energia, criação de dificuldades de financiamento de longo prazo para as empresas, entre outros, mais afasta o investimento, mais se desce a ladeira.
Portanto, a manutenção da Eletrobras pública é uma luta da sociedade brasileira como um todo.
A sociedade brasileira deve investigar os reais interesses do presidente da Eletrobras, pois falar em privatização em um momento em que deveria fazer o oposto, oferecendo a Eletrobras, única grande empresa pública ligada à produção atualmente em condições excepcionais de alavancar investimentos em toda a cadeia produtiva do país, é porque escancarou de vez, não se aguenta mais, seu cinismo é muito mais forte do que ele próprio.
Falar agora em privatização da Eletrobras só torna pública a percepção de que algo tem de muito podre na questão da transferência do controle a mega especuladores, que semeiam pobreza por todo o planeta e achacam, sobretudo, os países em desenvolvimento.
* Informe 034/20 da AEEL