Brasil de Fato: ‘Um 1º de Maio de contradições’

No Brasil, pelo segundo ano consecutivo, os atos do Dia Internacional de Luta dos Trabalhadores foram tímidos

Rodrigo Chagas*

Como é bom ver as ruas do nosso continente cheias de gente no Brasil de Fato. A classe trabalhadora mobilizada, em luta, mesmo em condições mais ou menos adversas.

Neste 1º de maio, em contraponto aos atos esvaziados no Brasil, vimos a presença massiva de trabalhadoras e trabalhadores nos nossos vizinhos latino-americanos.

Em Cuba, onde as marchas do 1º de Maio são tradição desde antes da revolução, 200 mil pessoas estiveram em Havana.

Já o presidente venezuelano Nicolás Maduro anunciou, em meio a uma multidão em Caracas, o aumento do auxílio pago a trabalhadores para US$ 130.

Atos massivos também foram registrados na Bolívia, no México e na Argentina, onde a marcha organizada pelas centrais sindicais marcou a preparação para a greve geral prevista para 9 de maio contra o governo de Javier Milei.

As ruas de Bogotá estavam cheias de gente quando o presidente colombiano Gustavo Petro anunciou o rompimento de relações com o “governo genocida” de Israel, ecoando vozes mundiais contra o genocídio do povo palestino.

Até nos EUA, a madrugada do dia 1º de maio foi de repressão e prisões dos estudantes que ocupam universidades para protestar contra o massacre em Gaza.

Nenhum direito a mais

No Brasil, pelo segundo ano consecutivo, os atos do Dia Internacional de Luta dos Trabalhadores foram tímidos na maioria das capitais. Inclusive em São Paulo (SP) – mesmo com a presença do presidente Lula.

O Itaquerão esvaziado e o ato morno convocado sob o lema “Por um Brasil mais justo” demonstram o tamanho do desafio que há pela frente na reconstrução da consciência política e da unidade da classe trabalhadora.

A “volta à normalidade” propagandeada pelo governo, que comemora o retorno da economia aos trilhos do crescimento e estabilidade, não empolga as ruas e não movimenta as massas.

O presidente não parece preocupado. Em seu discurso, apresentou ações de governo e minimizou o enfrentamento com a direita no Congresso Nacional. Lula pintou um país “em paz” enquanto seu governo perde popularidade, o bolsonarismo se mantém mobilizado e a organização da classe trabalhadora definha.

É justa a pauta do governo, focada no emprego decente, na correção no imposto de renda, na redução dos juros e na ideia de que a melhora da economia vai ter reflexos nas condições de vida da classe trabalhadora. Mas sem uma proposta contundente, nada novo, nenhum direito a mais, essa pauta não lota estádio.

Talvez o esvaziamento do 1º de Maio tenha a ver com o fato de que nenhum dos direitos retirados das trabalhadoras e trabalhadores do Brasil desde o golpe contra Dilma Rousseff tenha sido devolvido. Ou pior: pelo fato de que isso nem esteja em cogitação.

Não há previsão de que os retrocessos dos últimos anos serão revistos. Pelo contrário, a proposta de regulamentação do trabalho por aplicativos, por exemplo, não causa alarde nas gananciosas empresas e gera revolta em parte dos trabalhadores superexplorados.

Já na perspectiva dos sindicatos e centrais, há uma crise de representatividade que não dá conta de organizar os quase 40% de trabalhadores informais e, ao mesmo tempo, o número de filiados vem reduzindo ano a ano, chegando ao menor patamar da história.

A classe trabalhadora se distancia da luta nas ruas. A direita e o bolsonarismo, que trabalharam para propiciar esse cenário, agora se movimentam para tentar dar novos sentidos políticos a essa massa informalizada e precarizada.

Mas, apesar da crise, as centrais prometem luta. A maior delas, a Central Única dos Trabalhadores (CUT) está convocando uma marcha a Brasília para o próximo dia 22.

Conhecer a história

Numa breve newsletter, não pretendo responder aos desafios postos à classe trabalhadora neste complexo momento histórico do Brasil e da América Latina.

Nossos vizinhos não estão em condições tranquilas tampouco estão melhores do que o Brasil, mas seguem demonstrando força e mobilização.

Olhar para as massas latino-americanas nas ruas nesta data tão simbólica nos ajuda a não esquecer: nada veio de graça. Nenhum dos direitos hoje ameaçados nos foi dado. Todos, sem exceção, são fruto da luta trabalhadora.

Para servir de inspiração, quero compartilhar um trecho do discurso de Fidel Castro no 1º de Maio de 2000, em Cuba. Fidel discursa em defesa da revolução, uma palavra que anda esquecida, mas que pode apontar caminhos a seguir:

“Revolução é sentido do momento histórico; é mudar tudo o que deve ser mudado; é a plena igualdade e liberdade; é ser tratado e tratar os outros como seres humanos; é nos emanciparmos por nós mesmos e com nossos próprios esforços; é desafiar as poderosas forças dominantes dentro e fora da esfera social e nacional; é defender os valores em que se acredita ao preço de qualquer sacrifício; é modéstia, abnegação, altruísmo, solidariedade e heroísmo; é lutar com audácia, inteligência e realismo; é jamais mentir ou violar princípios éticos; é a profunda convicção de que não há força no mundo capaz de esmagar a força da verdade e das ideias. Revolução é unidade, é independência, é lutar por nossos sonhos de justiça para Cuba e para o mundo, que é a base de nosso patriotismo, nosso socialismo e nosso internacionalismo.”

Que a luta não seja esquecida.

 

* Rodrigo Chagas é coordenador de Redação.
Edição: Rafaella Coury

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