O Congresso Estadual do Sindicato dos Engenheiros no Estado do Rio de Janeiro (Senge RJ) elegeu seus delegados e aprovou as seis propostas que serão levadas ao 12º Congresso Nacional de Engenheiros (Consenge), a ser realizado pela Federação Interestadual de Sindicatos de Engenheiros (Fisenge), em setembro. As propostas respondem a dois eixos definidos para debate durante o Consenge: Reestruturação e Sustentabilidade Sindical; e A Construção de um Novo Projeto para o Brasil.
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Em resumo, o Senge RJ propõe, no primeiro tema, que a Fisenge e seus sindicatos desenvolvam estratégias e ações de interação com estudantes de engenharia, incentivando o cooperativismo e os programas de extensão no campo da engenharia pública; apoiem a auto-organização dos trabalhadores, buscando alternativas que integrem movimentos sociais, organização nos territórios e uma nova agenda, ampliada; e promovam seminários e debates sobre a reestruturação sindical.
Para um novo projeto de país, as propostas aprovadas preveem a inserção da Fisenge na campanha por um referendo revogatório das medidas de ataques a direitos e à soberania tomadas após o golpe de 2016; o apoio à formação de bancadas de representantes de trabalhadores e movimentos sociais, em defesa da soberania popular, em todas as instâncias, nas eleições de 2022; e a realização de seminários e debates para aprofundar a elaboração de um programa para o país.
Para subsidiar as discussões sobre os dois temas, o Congresso do Senge RJ, realizado nos dias 28 e 29 de julho, contou com apresentações dos economistas Paulo Jäger, superintendente técnico do Dieese no Rio, que abordou a reestruturação sindical; e Sergio Gabrielli (foto), ex-presidente da Petrobras, que fez uma análise da conjuntura macroeconômica nacional.
Ênfase a serviços públicos na retomada
Segundo Gabrielli, a ênfase da atividade econômica brasileira, a partir de 2023, deve ser dada à área de serviços. “Mais do que tentar uma retomada industrial, vamos ter que aumentar a infraestrutura social do país, olhando o complexo econômico da saúde, da educação, dos programas de transferência de renda, tentando estimular o desenvolvimento do comércio local e transações por meio de fomento a rendimentos, incluindo transferências governamentais (Bolsa Família, auxílio emergencial, etc.).”
A atenção ao consumo e aos investimentos precisará ter duas características ou aspectos principais, de acordo com o ex-presidente da Petrobras: o combate à desigualdade e a mudança de matriz energética. “De um lado, uma intensa preocupação com a inclusão social e a redução da pobreza; e de outro, com a transição energética necessária para um novo processo de sistema energético, particularmente elétrico, no país, com fontes renováveis.”
Na avaliação de Gabrielli, diversos fatores conjunturais e estruturais não permitiriam a retomada econômica de base industrial convencional. “Acho que não voltaremos ao modelo de desenvolvimento das décadas de 50 e 60, e teremos muitos desafios para reconstruir o Brasil, mas mantendo o mesmo tipo de preocupação: é necessário reduzir a pobreza, a desigualdade; e a ampliação do mercado doméstico, que envolve a retomada da soberania nacional e de um projeto de desenvolvimento de país.”
O governo que assumir após as eleições de 2022 terá pela frente, na avaliação do economista, muito mais dificuldades do que em 2003. “A situação piorou. Em 2023, o governo vai ter um mercado de trabalho totalmente desorganizado, um volume de desemprego gigantesco e um volume de pessoas fora do mercado de trabalho inédito. Felizmente, este governo ainda não dilapidou as reservas internacionais que nós acumulamos, o que significa que vai haver algum manejo da taxa de câmbio. Mas não muito grande, porque a situação de aumento das importações deve crescer: a China, a Europa e os EUA, países fornecedores de produtos industriais, voltam a crescer, criando mais dificuldade de retomar a indústria brasileira.”
O setor de petróleo e gás, que foi importante para a retomada da economia em 2003, está agora desestruturado, diz Gabrielli. “O marco regulatório, a capacidade da Petrobras, a engenharia brasileira – totalmente desmontados. Então dificilmente se retoma aquele modelo em que a Petrobras era âncora de um processo de desenvolvimento nacional com uma cadeia de conteúdo local importante.”
Por outro lado, o segmento que apresenta hoje os melhores indicadores no PIB, o agronegócio brasileiro agrega baixo conteúdo local. “A agricultura brasileira está bombando, mas exporta a maior parte dos seus produtos in natura”, explica Gabrielli. “O grau de processamento do agronegócio brasileiro é muito baixo. E isso, consequentemente, vai colocar mais dependência no ciclo do preço de commodities para a agricultura brasileira. Da mesma forma como temos minério de ferro, mas não siderúrgicas.”
O economista acredita que “não se muda a desestruturação dos setores e as relações inter-setoriais de um dia para outro; o desmonte na cadeia do petróleo e gás, por exemplo, não se remonta de um dia para o outro. Se remontar, será em novos moldes, novos tipos de relações entre as empresas.”
Reorganização e sustentabilidade sindical
As transformações de estrutura e conjuntura têm reflexos nas relações de trabalho e nos modos de organização sindical, tema da palestra do superintendente técnico do Dieese no Rio de Janeiro, Paulo Jäger.
Globalmente, a automação intensiva e outras tecnologias que sustentam a chamada indústria 4.0 estão destruindo ocupações e criando outras, num balanço, contudo, desfavorável para os países periféricos que são compradores de tecnologia, como o Brasil. Além disso, diz o técnico do Dieese, “essas novas tecnologias permitem uma gestão da produção num nível jamais visto na produção capitalista, de maneira fragmentada em escala global. A possibilidade dessas novas tecnologias de comunicação, as plataformas digitais, de espalhar cadeias de produção terceirizadas mundo afora, sem perder a coerência, exacerbando a ideia do trabalho remoto, deslocaliza o trabalho.”
Entre outros efeitos, isso significa, destaca ele, “um grande desafio para a ação sindical, com a possibilidade da desintermediação da força de trabalho – pelo sindicato e pelo Estado, na sua ação fiscalizadora e reguladora, porque o vendedor e comprador da força de trabalho se encontram diretamente, e o trabalho é feito, pago, sem que ninguém fique sabendo.”
A dispersão dos trabalhadores, vários trabalhando em casa, sem o eixo geográfico da sede física, torna importante, de acordo com as análises do Dieese, promover a organização também nos locais de moradia, “e em outras dimensões da vida, que vão precisar de algum tipo de representação para fazer valer direitos”. As novas plataformas digitais também poderão viabilizar experiências coletivas ou cooperativas de mediação de compra e venda da força de trabalho, ou de oferta de serviços de apoio.
Além dessas tendências estruturais, o Brasil passou por várias reformas, principalmente a trabalhista, com grande impacto no movimento sindical, mexendo com as negociações coletivas, o acesso à Justiça do trabalho – uma queda de cerca de 30% depois da reforma – o aumento da terceirização e novas formas de contrato.
Jäger destaca, em especial, o fim da contribuição sindical – que despencou 98,5% entre 2017 e 2020 – , ao mesmo tempo em que se manteve a obrigação de o sindicato continuar a negociar para toda a categoria. “Tem o ônus de fazer a negociação para todo mundo, mas não tem o financiamento de todos que serão beneficiados por aquele acordo ou convenção”, diz. “As regras do jogo foram concebidas para o sindicato em um momento da economia, mas chegamos agora a uma situação com migração forte para economia de serviços e do conhecimento.”
Para uma nova estrutura, Jäger indica como elemento para reflexão a heterogeneidade das categorias – com trabalhadores com e sem carteira, autônomos com e sem CNPJ, contratos para trabalho intermitente, parcial, etc. “São dados para pensar: quem o sindicato representa?”, questiona.
Outro aspecto relevante apontado pelo superintendente do Dieese é a renovação de quadros. Segundo ele, uma pesquisa sobre sindicalização, em países europeus, feita com jovens, perguntou sobre a sua participação política. O resultado mostrou que os jovens dão valor a questões como solidariedade e têm uma posição em geral contestadora, mas não veem o sindicato como espaço para atuar politicamente. “Não é que não tenham interesse pelas questões de ordem política, pelo meio ambiente ou o futuro do trabalho, mas talvez não vejam o sindicato como veículo para fazer essa luta. Não sei se a pesquisa se aplica ao Brasil, mas é um grande desafio descobrir como incorporar os jovens, para que eles façam do sindicato uma outra coisa.”
Finalmente, Jäger alerta para a fragmentação política da representação, com o paradoxal crescimento do número de sindicatos, paralelo à queda dos sindicalizados, e defende a importância de contar com veículos de comunicação fortes e independentes, eventualmente uma rede de TV gerida pelas entidades.
12º Consenge
“A engenharia, o sindicalismo, a democracia e a soberania nacional” são os temas do 12º Congresso Nacional de Sindicatos de Engenheiros (Consenge), que será realizado entre os dias 9 e 11 de setembro, no Rio de Janeiro. O evento acontecerá de maneira híbrida, ou seja, de forma presencial e virtual, de modo a cumprir os protocolos vigentes da pandemia de covid-19.
O congresso vai abordar os temas “Organização sindical” e “Resistir e reconstruir um Brasil soberano”, a partir dos eixos: política de reestruturação sindical; sustentabilidade sindical; o futuro do trabalho e uma revisão da reforma trabalhista com foco nas formas de contratação; a construção de um novo projeto para o Brasil; a retomada dos setores estratégicos brasileiros; e meio ambiente, agricultura e soberania alimentar.
A agenda presencial do 12º Consenge acontecerá no Hotel Mirador, em Copacabana (RJ), e a virtual, por meio da plataforma Zoom. Participam os delegados eleitos nos congressos estaduais. Clique aqui para conhecer os delegados do Senge RJ