Instituto Telecom*
O dia 24 de agosto de 1954 ficou marcado como um momento trágico na história do Brasil. Naquele dia, após uma forte campanha da mídia – com o jornal O Globo à frente, acusando-o de liderar o governo mais corrupto da história –, Getúlio Vargas deu um tiro no coração.
O mesmo O Globo que apoiou o golpe de 1964; que foi contra os avanços democráticos contidos na Constituição de 1988, principalmente o Capítulo V, que trata da Comunicação Social; que apoiou o golpe 2016 e se empenhou para a eleição do capitão, agora se vê na condição de vítima, quando um de seus repórteres é ameaçado – “minha vontade é encher tua boca com uma porrada”. Uma agressão absurda e condenável, lógico. Mas onde estava o Globo, que hoje evoca a liberdade de imprensa, o respeito à liberdade de expressão, quando houve a 1ª Confecom (Conferência Nacional de Comunicação), em 2009? Convocada pelo Governo Federal e coordenada pelo Ministério das Comunicações, a Conferência contou com a participação de 8,5 mil pessoas, entre representantes do poder público, dos movimentos sociais, ONGs, sindicatos, associações, entre outros, e dos empresários.
O principal objetivo da Conferência, cujo tema central foi “Comunicação: meios para a construção de direitos e de cidadania na era digital”, foi a elaboração de propostas orientadoras para a formulação da Política Nacional de Comunicação. A participação social foi garantida em todas as suas etapas. No final, foram aprovadas 633 resoluções.
O Sistema Globo fez campanha contra a Conferência e não participou dela. A desculpa esfarrapada foi a de que “querem cercear a liberdade de expressão”. Sabiam, como sabem ainda hoje, que era e é mentira. Na Conferência foram aprovadas propostas para, como diz a Constituição nos artigos 220 a 224, impedir “qualquer censura de natureza política, ideológica e artística”; garantir “a promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que objetive sua divulgação”. Artigos que não foram até hoje regulamentados e um dos principais culpados é justamente o Sistema Globo.
Nós, do Instituto Telecom, apoiamos todas as teses pela democratização das comunicações. Apresentamos uma proposta que foi aprovada e pela qual continuamos a lutar até hoje: a universalização da banda larga. Essa luta específica tem enfrentado o obstáculo das grandes operadoras Oi, Vivo, TIM, Claro, que só pensam no lucro.
Em 1994 houve um tiro na Constituição, quando, pela Emenda Constitucional nº 8, o governo FHC viabilizou a privatização das telecomunicações. Resultado: péssimos serviços, demissão, terceirização em massa, índices de qualidade baixíssimos. Mais de 20 anos depois, as operadoras, em conluio com o capitão e com o apoio da Globo, aprovaram a Lei 13.879/2019, que garante a elas serem donas dos bens reversíveis, R$ 120 bilhões que são de propriedade da União.
O furo no pijama de Getúlio deve ser um símbolo para a luta de todos os democratas contra o golpe, pela democratização das comunicações, pela universalização da banda
larga.
Chega de porrada e tiros na democracia!
*Publicado por Instituto Telecom em 25 de agosto de 2020
Foto: Manifestação contra o golpe que derrubou a presidenta Dilma Rousseff, Copacabana, RJ, 2016