Por Jorge Folena*
Na cidade de Niterói (capital do antigo Estado do Rio de Janeiro até 1975, quando o regime ditatorial de 1964-1985 impôs a fusão com o Estado da Guanabara), como em outras cidades do país, o segundo turno da eleição municipal de 2024 nos apresenta uma disputa entre um candidato do campo democrático, popular e progressista (o ex-prefeito Rodrigo Neves, do PDT) e um candidato bolsonarista (Carlos Jordy, do PL), típico representante da geração que ascendeu com a onda fascista, que ganhou força com as ações neoliberais intensificadas depois do golpe contra a ex-presidente Dilma Rousseff, em 2016.
De acordo com a pesquisa Atlas Intel, divulgada em 17 de outubro de 2024, Rodrigo Neves lidera com 60,5% e Carlos Jordy com 39,5%, em total de votos válidos. Contudo, a pesquisa traz um dado que considero importante para reflexão, qual seja: na faixa etária entre 16 e 34 anos, Jordy tem 54,1% e Neves 45,5% da preferência do eleitorado.
Em Niterói encontra-se a sede de uma das maiores universidades públicas do país, a Universidade Federal Fluminense; há diversas políticas públicas direcionadas à cultura, ao lazer, à prática esportiva e aos jovens. Mesmo assim, a pesquisa aponta que a maioria da juventude pode estar se identificando com o discurso fascista e suas manifestações de incentivo à violência, à exclusão, ao atraso cultural e à distorção da estética, em contraponto aos valores de frescor, rebeldia e beleza, próprios da mocidade.
Para prosseguir em sua estratégia de concentração constante e crescente de capital, o neoliberalismo necessita distorcer a realidade, empregando mentiras e jogando os trabalhadores uns contra os outros, o que faz com o auxílio das muitas forças que controla, a exemplo da mídia tradicional e das chamadas mídias sociais.
Do mesmo modo que alavancou as duas grandes guerras mundiais ocorridas no século XX, a absurda concentração de renda atingida nos tempos atuais traz de volta o fascismo, com seus falsos mitos, impregnados de ódio, factoides e mentiras, que utiliza as tecnologias da rede mundial de computadores para fomentar o individualismo e apagar a conexão com as lutas e conquistas coletivas do passado; com essa pregação, conquistam corações e mentes dos ressentidos e desesperançados, que passam a crer que têm direito a tudo, aqui e agora, sem nenhuma obrigação ou contrapartida em relação à sociedade.
Nessas reflexões, resgatei o conceito do “homem massa”, de Ortega y Gasset, por ele descrito como “um tipo de homem feito à pressa, montado apenas sobre umas quantas e pobres abstrações (…) o homem previamente esvaziado da sua própria história, sem entranhas do passado, por isso, dócil a todas as disciplinas chamadas internacionais. Mais do que um homem, é apenas uma carapaça de homem constituído por meros idola fori; carece de um adentro, de uma intimidade sua, inexorável e inalienável, de um eu que não se possa revogar. Daí que esteja sempre na disponibilidade de fingir ser qualquer coisa. Só tem apetites, crê que só têm direitos e não obrigações: é um homem sem a nobreza que obriga – sin nobilitate – snob.”
Vemos então que as mesmas condições do fracasso do liberalismo e do capitalismo no passado continuam a se manifestar no presente, pois, em sua crise mais recente, o regime de superacumulação continua a forjar o homem “feito à pressa” e “esvaziado da sua própria história”. Diante dessa constatação, é inegável a necessidade de continuarmos na resistência contra o neoliberalismo e o fascismo, representantes de um regime condenado, fracassado em sua própria história, que, nos seus estertores de morte, utiliza as últimas forças para continuar em sua saga de terror, violência e expropriação, que recorre até ao genocídio mais despudorado, o que revela sua completa degradação moral.
Diante disto, entendo que o momento não deve ser percebido como de desesperança, pois, mesmo com todas as dificuldades que nos são impostas, há resistência, pois a luta de classes está a cada dia mais acirrada, ainda que a classe dominante, empregando os usuais instrumentos de controle, procure apagar e esconder suas manifestações, inculcar a ideia de que ela não mais existe e até mesmo negar a vitória das forças populares contra o nazifascismo, durante o século XX.
O atual regime político e econômico está em decadência justamente porque se recusou a proporcionar paz, harmonia e felicidade às pessoas e persistiu em práticas abomináveis, que só fizeram ampliar o mal-estar da civilização, como apontou Freud em 1930.
Para concluir, afirmo que, para o enfrentamento permanente contra o fascismo, é preciso que as forças populares continuem firmes na luta histórica de congregar, organizar, ensinar, educar e conscientizar a classe trabalhadora.
* Folena é advogado e cientista político. Secretário geral do Instituto dos Advogados Brasileiros e Presidente da Comissão de Justiça de Transição e Memória da OAB RJ, Jorge também coordena e apresenta o programa Soberania em Debate, do movimento SOS Brasil Soberano, do Senge RJ.
Foto: Marcelo Casall Jr. – Agência Brasil