Entidades das engenharias articulam parcerias para o enfrentamento dos grandes desafios da reindustrialização nacional

O Clube de Engenharia, o Senge RJ e demais entidades das engenharias e das geociências no Rio de Janeiro e no Brasil precisam unir esforços para fortalecer uma atuação conjunta em defesa do desenvolvimento social e econômico e da neoindustrialização do Brasil

A conjuntura atual impõe grandes desafios, mas também abre oportunidades estratégicas. Em um mundo multipolar, impulsionado pela política externa dos governos Lula e Dilma, o Brasil consolidou sua participação em blocos que incluem a China, seu principal parceiro comercial, uma potência que demonstra ao mundo como mobilizar o desenvolvimento nacional. Ao mesmo tempo, as forças do capitalismo tardio agem sem disfarces: desmontam proteções sociais, reconfiguram profundamente o mundo do trabalho e utilizam a tecnologia como instrumento de precarização e desinformação. Diante desse cenário, recolocar o Brasil no tabuleiro geopolítico de forma soberana, promovendo um desenvolvimento social sustentável, é uma tarefa viável, mas repleta de desafios.

Em meio à crise perfeita, o Brasil – uma potência reconhecida globalmente, especialmente no contexto da transição energética obrigatória – continua aprisionado em um modelo que dificulta o investimento estatal. Esse modelo já demonstrou sua ineficiência ao longo da história, mas o mercado – representado pelo 1% mais rico – persiste em impô-lo ao Poder Público.  Neste cenário, aproveitar as janelas de oportunidade para gerar empregos qualificados, promover a distribuição de renda e romper com a lógica que submete os investimentos públicos aos interesses de poucos exige um trabalho coordenado nacionalmente, esforço que o governo federal vem tentando articular.

União de propósitos: da esquerda para a direita, os diretores Pedro Monforte e Miguel Sampaio, do Senge RJ e do Clube de Engenharia; o ex-presidente do sindicato e ex-deputado, Jorge Bittar; Olímpio Alves dos Santos e Paulo Granja, presidente e diretor do Senge RJ, respectivamente; Francis Bogossian, presidente do Clube de Engenharia e Alberto Balassiano, ex-presidente da SEAERJ.

Para que a política industrial planejada pelo governo Lula 3 alcance êxito e o Brasil inicie um ciclo de desenvolvimento verdadeiramente transformador, baseado em tecnologia de ponta e inovação, o papel das engenharias é fundamental. A união das entidades do setor é, especialmente neste momento, uma condição sine qua non para que o país cresça, distribua renda e reduza as profundas desigualdades que marcam sua história. Essa é a defesa de Francis Bogossian, presidente do Clube de Engenharia, a primeira entidade das engenharias no Brasil.

“Infelizmente o Presidente Lula, eleito democraticamente, não consegue botar em andamento o PAC, face aos entraves oferecidos pela conjuntura. Sem obras públicas, os menos favorecidos estão desempregados ao invés de não só estarem sendo remunerados, como também capacitados para funções especializadas. Por que não colocamos o Clube de Engenharia agregando os sindicatos e associações de classe para lutar juntos pela retomada do desenvolvimento, da defesa da Engenharia Nacional e da Soberania do País impulsionados pela PAC e INB?”, questiona Francis.

O presidente do Senge RJ, Olímpio Alves dos Santos, concorda com a importância do trabalho conjunto neste momento para a sistematização de um projeto da engenharia brasileira para o futuro do país. “É importante que as entidades trabalhem juntas para que possamos discutir minimamente qual seria este nosso processo de industrialização. O Brasil tem o NIB (Projeto Nova Indústria Brasil), mas acho que a engenharia, nós engenheiros e engenheiras, temos que ter propostas para agregar. Precisamos pensar no desenvolvimento da nossa infraestrutura, que gera demanda para a indústria brasileira. Precisamos produzir aço para fazer trilhos, buscar o domínio de tecnologias de ponta, como a dos painéis fotovoltaicos que hoje importamos da China ou das turbinas eólicas que importamos da Europa. Pensar a transição energética, mas ir além dela”, destaca Olímpio. 

Antes de tudo, engenheiros

Recém-eleito para sua terceira gestão à frente da entidade nacional, com o apoio do Sindicato dos Engenheiros no Estado do Rio de Janeiro (Senge RJ), Francis Bogossian defende um trabalho conjunto entre trabalhadores e empresários, uma parceria estratégica voltada para interesses comuns.

Fórum da Indústria Naval mostra na prática a potência da união de entidades de classe, de trabalhadores e patronais em torno de um projeto comum.

Um exemplo recente de articulação bem-sucedida – acompanhado de perto pelo Senge RJ – foi a luta do sindicato pela retomada da indústria naval. Criado em 2022, o Fórum Permanente para o Desenvolvimento do Setor Naval nasceu de um movimento da sociedade civil e dos trabalhadores, mas, desde o início, contou com a participação de representantes da indústria, dos estaleiros e dos empresários do setor.

Acostumados a negociar em lados opostos nos Acordos Coletivos de Trabalho, trabalhadores e empregadores se encontraram, desta vez, do mesmo lado da mesa, em defesa de um objetivo comum: a recuperação do setor naval. Mais tarde, a pauta conquistou a adesão de parlamentares, resultando na criação de frentes e bancadas estaduais e federais. O debate avançou até chegar à Presidência da República e seus ministérios, e os primeiros resultados concretos começam a surgir.

“O patrão precisa do empregado, o empregado precisa do patrão. E, a nação precisa de ambos. Não há Nação sem progresso e desenvolvimento. Não há progresso e desenvolvimento sem a Engenharia. Não há Engenharia sem progresso e desenvolvimento. Juntos, faremos avançar a Engenharia Nacional, assumindo a visão comum do desenvolvimento social sustentável e a verdadeira e necessária redução das desigualdades”, defende Francis.

Desafios, representatividade e força coletiva

Os efeitos do aquecimento global tornam-se cada vez mais evidentes, ao mesmo tempo em que assistimos à ascensão da extrema-direita, à perda de direitos conquistados, ao aumento das desigualdades e à precarização crescente da vida dos trabalhadores. Nesse contexto, retomar um plano de desenvolvimento nacional soberano já é, por si só, um desafio colossal. O governo não será capaz de implementar, sozinho, todas as medidas necessárias para inaugurar um novo ciclo virtuoso. O papel das entidades de classe nessa grande engrenagem é fundamental, como foi em tantos outros momentos de virada de chave na história do Brasil.

Não por acaso, quando os interesses do grupo no poder estavam voltados à manutenção do país na periferia da economia global, as pontes com entidades de classe e movimentos sociais foram sistematicamente destruídas. Desde a redemocratização, nenhum governo se distanciou tanto da sociedade organizada quanto os de Temer e Bolsonaro. A reconstrução desse diálogo esteve entre as prioridades do governo Lula 3, que empreendeu um esforço significativo nesse sentido já no primeiro ano de gestão. No entanto, segundo Francis Bogossian, essa interlocução ainda não foi totalmente restabelecida.

“Os acessos das entidades de classe aos centros de decisão, na minha opinião, não estão ainda plenamente restabelecidos. Elas foram sendo afastadas pelos governos Temer e Bolsonaro começaram a ser reconstruídas no início do atual governo mas, ainda falta muito a fazer em favor do indispensável espaço que lhes foi subtraído para garantir a importantíssima representação e participação cidadã  junto aos governos”, defende Francis.

Para Olímpio, solidificar o acesso da engenharia aos centros de decisão depende de um projeto sistematizado para o país. “É preciso ter a clareza de que sem um projeto, não adianta nós reclamarmos que não há atenção do governo. A engenharia precisa se debruçar sobre o assunto, pensar e construir esse projeto”, destacou Olímpio, apontando a importância que o Fórum Nacional da Engenharia pode ter neste contexto. 

Sociedade e academia

Entre os muitos desafios da engenharia nacional, um dos mais urgentes é a formação de novos engenheiros. Para que a Nova Indústria Brasil – política industrial que orienta o desenvolvimento nacional no terceiro governo Lula – tenha êxito, o país precisa expandir a qualificação de sua mão de obra técnica nos próximos anos.

O Curso André Rebouças é uma iniciativa conjunta do Senge RJ e Clube de Engenharia, com patrocínio da Mútua RJ, que oferece reforço em Cálculo I para estudantes negros e periféricos da UFRJ.

Em diversos discursos, o presidente Lula tem reforçado essa necessidade. Em dezembro de 2023, criticou o excesso de advogados formados no Brasil em comparação ao número de matemáticos, físicos e engenheiros. Já em abril de 2024, voltou ao tema ao criticar empresas como a Boeing, que frequentemente recrutam engenheiros brasileiros. “Não é que a gente quer impedir alguém de trabalhar fora, muito pelo contrário. Mas a gente precisa discutir que não é honesto vir aqui roubar nossos engenheiros sem gastar um tostão para formá-los”.

O presidente sabe bem do que está falando. Seu discurso não se limita ao custo da formação acadêmica, mas aponta para um dos maiores desafios de qualquer nação: qualificar sua mão de obra para um mundo em constante avanço tecnológico e criar condições para que esses profissionais permaneçam no país.

Esse não é um problema novo. No segundo governo Lula, o Brasil precisou importar engenheiros para manter seu ritmo de desenvolvimento. Hoje, porém, há um agravante: milhares de jovens formados em engenharia tiveram que recorrer a trabalhos precários, como aplicativos de transporte, devido à falta de perspectivas na profissão nos últimos anos.

“Temos este desafio extra, de convencer jovens e adolescentes de que eles não repetirão o ciclo anterior, quando formamos milhares de engenheiros que, ao chegarem no mercado de trabalho, não encontraram espaço para exercer a função. Para isso, precisamos de um projeto de longo prazo. Um projeto de Estado que garanta a continuidade das contratações”, diz Bogossian. 

Olímpio completa, reforçando a necessidade de planejamento estruturado para a valorização da engenharia no Brasil: “O resultado daquele tempo onde engenheiros eram escassos é uma grande parte de nós que hoje trabalha por muito pouco. Para que o jovem acredite que há futuro na carreira, os projetos precisam ser de longo prazo. O desenvolvimento soberano do país, que certamente vai demandar engenharia na construção civil, naval, tecnologia de ponta etc, mas é preciso ter um projeto de Nação e que ele não seja apenas de alguns, mas de todos os brasileiros, imbuídos da vontade de levá-lo a cabo. Só assim vamos conseguir superar a desigualdade e consolidar a nossa soberania”.

 

Rodrigo Mariano/Senge RJ | Fotos: Freepik / Canva / Claudionor Santana / Coletivo Força Motriz

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