Dois novos manifestos de ex-ministros denunciam desmontes do Estado brasileiro. Depois das cartas dos ex-titulares das pastas do Meio Ambiente (em maio) e da Educação (no início de junho), desta vez, os documentos tratam dos ataques ao patrimônio e aos investimentos nacionais nas áreas de Ciência, Tecnologia e Inovação, e da Cultura.
Os ex-ministros da Cultura Luiz Roberto Nascimento Silva (Itamar Franco, 1993-1994), Francisco Weffort (Fernando Henrique Cardoso, 1995-2002), Juca Ferreira (Lula, 2008-2011; Dilma Rousseff, 2015-2016), Marta Suplicy (Dilma Rousseff, 2012-2014) e Marcelo Calero (Michel Temer, 2016) divulgaram nesta terça-feira (2) manifesto criticando a “desvalorização e hostilização à cultura brasileira”. Declaram que o fim do Ministério da Cultura pelo atual governo “é um erro”, e apontam “a redução de forma contínua dos recursos para o setor cultural”, por meio “do contingenciamento do Fundo Nacional de Cultura e da demonização das redes de incentivo, notadamente a Lei Rouanet”.
O documento foi redigido após reunião no Instituto de Estudos Avançados da USP, onde debateram sobre o atual momento do país. “Assistimos, com preocupação, o crescente ambiente antagônico às artes à cultura, que pretende enfraquecer as conquistas que o Brasil alcançou nestes anos de democracia”, escreveram. “A primeira e mais primordial das responsabilidades do Estado é garantir a plena liberdade de expressão.”
Segundo reportagem no portal UOL, o ex-ministro Juca Ferreira declarou ainda a jornalistas que, no atual governo, ” os artistas podem sofrer mais agora do que sofreram na ditadura militar” e que já há registro de censuras e perseguições.
Retrocesso sem paralelo na ciência
Já o manifesto em defesa da educação, em particular da ciência e tecnologia, foi divulgado na segunda-feira (1), e é assinado por dez ex-ministros, que alertam para os cortes orçamentários “drásticos” no setor, que podem resultar em um “retrocesso sem paralelo na história da Ciência brasileira, área essencial e crítica, tanto ao desenvolvimento econômico e social quanto à soberania nacional”.
Intitulado “C&T em estado de alerta”, o documento é assinado pelos ex-ministros Aldo Rebelo, Aloízio Mercadante, Celso Pansera, Clélio Campolina, José Goldemberg, Luiz Carlos Bresser-Pereira, Marco Antonio Raupp, Roberto Amaral Ronaldo Sardenberg e Sérgio Machado Rezende. Segundo eles, o país vive, atualmente, “a maior das provações da nossa história”. Destacam, além dos cortes de verbas e cancelamento de bolsas de pesquisa, a desqualificação sistemática do corpo acadêmico e da base cientifica do país por parte de integrantes do govern Bolsonaro.
“Não podemos concordar com as recorrentes manifestações, por parte de autoridades do governo, que negam evidências científicas na definição de políticas públicas”, afirmam. “As pesquisas são fundamentais para o país avançar em direção a um desenvolvimento econômico, com inclusão social, respeito aos direitos humanos e sustentabilidade ambiental, que preserve nossos recursos naturais estratégicos. Esta bandeira pelo conhecimento não tem partido e não pertence somente à comunidade científica, acadêmica e empresarial, mas deve ser levantada por toda a sociedade. A linha de continuidade é o entendimento de que o Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia & Inovação constitui uma Política de Estado. Os extraordinários avanços da economia digital, da inteligência artificial, biotecnologia, automação e robótica, internet das coisas, novos materiais estão mudando rapidamente as formas de produção no mundo e estabelecendo um novo paradigma tecnológico com imensos desafios ao trabalho humano e ao Brasil como nação. O dispêndio em CT&I é um investimento virtuoso e estratégico. Desqualificar as universidades públicas que produzem mais de 90% da pesquisa brasileira e a privatização de empresas estratégicas são equívocos que podem custar caro à sociedade brasileira.”
Para os ex-ministros é inaceitável “a ausência de representantes da comunidade científica em Comitês e Conselhos Governamentais que discutem políticas públicas”. E advertem para as mudanças tecnológicas em curso no planeta que obrigam o Brasil a avançar a uma velocidade superior à da fronteira do conhecimento, “sob pena de termos, na melhor das hipóteses, uma estagnação relativa.”
A recuperação econômica, insistem os ex-ministros, tem a CT&I como instrumento transversal estratégico e indispensável. “Eis aqui o nosso chamado para que a sociedade brasileira se comprometa e se mobilize na defesa da Ciência, do Conhecimento e da Tecnologia, patrimônios de uma Nação”, concluem.