O fim das concessões públicas de telecomunicações há muito vem sendo defendido por integrantes do Conselho Diretor da Anatel. Hoje restritas à telefonia fixa, as concessões só não foram extintas graças à pressão dos movimentos sociais e ao fato concreto de que isso atenta contra a Constituição Federal.
Foi assim em 2012, quando o conselheiro Jarbas Valente defendeu a criação de um serviço convergente, em regime privado, reunindo todos os serviços atuais. Ele estimava que, com o fim dos bens reversíveis, cerca de R$ 40 bilhões ficariam com as operadoras, recursos que seriam investidos em compromissos. Alguém acredita?
No ano seguinte, 2013, ao participar de um seminário do setor o conselheiro Marcelo Bechara afirmou: “a regulação não pode ser máxima, nem mínima, tem de ser a necessária. A agência precisa saber tirar a regulação, regular o que precisa ser regulado, e não atrapalhar”. Segundo ele, o país está “caminhando para uma licença única, ou ao menos um mundo de licenças simplificadas.”
Ainda em 2013, o então ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, informava que estava em discussão no governo a entrega dos bens reversíveis do Estado (atualmente nas mãos das operadoras), em troca de investimentos em infraestrutura de telecomunicações, como fibras ópticas. A afirmação trouxe grande preocupação para toda a sociedade.
Agora, no dia 22 de fevereiro de 2016, o conselheiro Igor de Freitas propôs claramente ao Conselho Diretor da Anatel restringir ao máximo a prestação da telefonia fixa em regime público. Diz ele: “ao considerarmos esse mercado de voz, a oferta está largamente universalizada e relativamente competitiva, não há hipótese de recuperação da atratividade, e a telefonia fixa não está mais contemplada pela Política Nacional de Telecomunicações, resultado da perda de atratividade e do caráter de essencialidade do STFC, além da perda de amparo jurídico para sustentação da concessão”. Ora, isso não é verdade absolutamente. A telefonia fixa não está universalizada e a competição é quase inexistente na maior parte do Brasil. Qual é a falta de amparo jur ídico? Difícil explicar essa proposta.
A realidade é que os conselheiros da Anatel, que deveriam defender o interesse público, querem entregar ao mercado, exclusivamente, todos os serviços de telecomunicações. A depender deles, recursos públicos seriam dados de mãos beijadas para que as operadoras investissem em redes privadas, o que hoje é ilegal.
Para o conselheiro Igor de Freitas, “a exigência imposta na proposta inicial, de ampliação da rede de fibra óptica, são obrigações de fazer que, ao extrapolarem o limite da razoabilidade, distorcem o objeto dos contratos firmados”. Ou seja, ele é contrário a que os novos contratos de concessão e seus correspondentes planos gerais de universalização façam qualquer menção à banda larga, à expansão do backhaul interligando todos os municípios, por fibra ótica, aos backbones das operadoras.
É o reino encantado das operadoras: não terão mais obrigações de universalização, poderão escolher onde investir ou não, os preços ficarão livres para cobrarem quanto quiserem. Ganharão de bônus bilhões de reais públicos para utilizarem nas suas redes privadas. É ou não é um negócio da China para as concessionárias, leia-se Oi, Vivo e Grupo Claro?
O conselheiro Ricardo Zerbone pediu vistas do processo alegando que “as mudanças foram profundas e vou precisar fazer avaliações jurídica e regulatória antes de apresentar meu voto”.
O Instituto Telecom manda um recado a Zerbone: não deixe que seja cometido um ataque ao patrimônio nacional. Não deixe que um serviço estratégico como as telecomunicações fiquem à mercê única e exclusivamente do mercado. Garanta o capítulo da universalização do backhaul nos novos contratos de concessão. E coloque em destaque a discussão da banda larga em regime público.