Neste Dia Mundial da Água, Governo Federal precisa sinalizar pela reestatização das empresas de saneamento | Clóvis Nascimento

Por Clovis Nascimento*

Hoje, 22 de março, é Dia Mundial da Água e, no Brasil, milhões de pessoas sofrem com a falta de acesso à água potável. Os últimos anos no país foram de retrocessos políticos, econômicos, sociais e culturais. E o saneamento não ficou de fora deste cenário. Foram inúmeras as privatizações país afora, como a CEDAE, no Rio de Janeiro; a recente tentativa de privatização da SABESP, em São Paulo. 

No Rio de Janeiro, os governadores Wilson Witzel e Claudio Castro organizaram – sob o apoio do governo Bolsonaro – uma operação de entrega do patrimônio público, destruição da memória técnica da engenharia, autoritarismo com a sociedade civil e os movimentos sociais e fatiamento da Cedae. Esse processo teve início com a ADIN (Ação Direta de Inconstitucionalidade) nº 1.842/13 – apresentada no STF (Supremo Tribunal Federal) – e criou o instrumento das ‘Prestações Regionalizadas’, pelo qual os municípios são enquadrados como ‘interesse comum’ (fundamentalmente, regiões metropolitanas) com adesão compulsória, e aqueles de ‘interesse local’ aderem de maneira facultativa.

 A alienação de ações da Cedae foi oferecida como garantia para um empréstimo de R$ 2,9 bilhões obtido junto ao Banco BNP Paribas Brasil S.A., com a previsão de que o recurso deveria ser utilizado prioritariamente no pagamento da folha dos servidores. Em seguida, o Rio de Janeiro aderiu ao Regime de Recuperação Fiscal, em 2017.

Em 2018, a receita operacional da Cedae foi de R$ 5,6 bilhões e o lucro líquido de R$ 832 milhões, conforme dados extraídos do balanço da Cedae referente aquele ano e publicado no Diário Oficial do Estado do Rio de Janeiro em 2019. No ano de 2019, seu lucro líquido foi da ordem de R$ 1 bilhão. Mesmo com esses números, o Governo do Rio de Janeiro realizou a licitação para a concessão dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário em vários municípios divididos em quatro blocos/lotes.

Como vimos em vários casos internacionalmente e nacionalmente, a privatização segue não dando certo. Água falta em diferentes territórios, principalmente nas favelas, na Baixada e em regiões mais pobres. Há falta de saneamento e tratamento de resíduos sólidos.

Nesse sentido, é preciso uma agenda ampla em defesa do saneamento público no Brasil com alguns elementos importantes, sendo eles: a aprovação da PEC 6/2021, que inclui na Constituição a garantia do acesso à água enquanto direito fundamental, fortalecendo todas as políticas públicas na área de saneamento; a necessidade de barrar as privatizações em curso, como a Sabesp; o cumprimento do Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab) 2014-2033 rumo à universalização do saneamento; e a implementação e ampliação de programas de tarifa social. Levaremos estas e outras pautas para a Conferência Nacional das Cidades, mas o governo federal também precisa sinalizar pela reestatização das empresas de saneamento.

Água é vida. Não é mercadoria. E a vida das pessoas não têm preço, ainda mais em um momento de emergência climática. 

 

*Clovis Nascimento é engenheiro civil e sanitarista, secretário-geral da Federação Interestadual de Sindicatos de Engenheiros (FISENGE) e vice-presidente do Sindicato dos Engenheiros no Estado do Rio de Janeiro (Senge-RJ).  É um dos fundadores do Observatório Nacional dos Direitos à Água e ao Saneamento, tendo sido diretor administrativo e financeiro e é coordenador do Conselho Fiscal. Clovis Nascimento é pós-graduado em políticas públicas e governo, foi presidente Fisenge por dois mandatos. Exerceu o cargo de Subsecretário de Estado de Saneamento e Recursos Hídricos do Rio de Janeiro e foi Diretor Nacional de Água e Esgotos da Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental do Ministério das Cidades, no período de 2003 a 2005. Profissional com mais de 40 anos de atuação no setor de saneamento ambiental, na CEDAE. Clovis foi presidente da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (ABES), eleito por dois mandatos e também foi vice-presidente da 4ª Região da AIDIS – Asociación Interamericana de Ingenieria Sanitária y Ambiental, região que compreende os países Chile, Argentina, Paraguai, Uruguai e Brasil

Foto: Jefferson Rudy/Agência Brasil

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