‘Nosso dever é defender o trabalhador da Eletrobras, não fazer a gestão do caos’, diz Felipe Araújo

Às vésperas da última reunião de conciliação no Tribunal Superior do Trabalho, o diretor de Negociações Coletivas do Senge RJ fala sobre as dificuldades para encontrar um acordo quando um dos lados se recusa a buscar o consenso

Na próxima sexta-feira, 30/08, a Eletrobras privatizada terá uma última chance para a conciliação com o Coletivo Nacional dos Eletricitários – CNE, na busca de consenso sobre o Acordo Coletivo de Trabalho 2024, o primeiro negociado após a privatização da empresa. 

Em entrevista ao jornalista Anderson Gomes, o diretor do Senge RJ, Felipe Araújo falou ao Faixa Livre sobre a tentativa de diálogo que já dura cinco meses, com poucos avanços e uma resistência hercúlea da bancada patronal em debater os temas mais sensíveis para os funcionários e para o próprio país.

Desde a primeira rodada de negociações, as cláusulas sobre a garantia do emprego dos trabalhadores – muitos deles concursados que perderam a estabilidade com a privatização da empresa -, e o novo Plano de Cargos e Salários são alguns dos pontos que travaram as tratativas. De lá para cá, foram outras quatro rodadas, uma greve e um processo de dissídio coletivo que já passou por três audiências conciliatórias no Tribunal Superior do Trabalho – TST e outras 3 negociações diretas entre empresa e sindicatos, encaminhadas pelo tribunal. 

“Na reunião da última sexta-feira a gente estava com a esperança de que a empresa finalmente chegaria aos pontos essenciais para a categoria. De novo, ela trouxe os pontos secundários. Os mais sensíveis, eles seguem se recusando a negociar. Buscam uma ‘gestão de mudança de cultura’ que funciona na base da demissão de quem não concorda com que eles colocam”, contou Araújo.

Sobre a mesa, está a proposta de demissão de 25% da força de trabalho da empresa. Os demais não teriam garantia de emprego e trabalhariam sob um ritmo pesado para manter a empresa levando energia a todo país. Ainda assim, não seriam capazes de garantir a manutenção necessária em todo o sistema.

“Desde o início do processo de privatização, saímos de uma Eletrobras pública com 12.500 funcionários, para uma Eletrobras privada com 7.950 funcionários. Esses 25% de demitidos reduziriam a mão de obra da empresa em cerca de dois mil trabalhadores, num momento em que os problemas na infraestrutura já aparecem pelo Brasil. Estamos percebendo uma grande dificuldade da força de trabalho, sobrecarregada, em realizar a manutenção e tocar a operação do sistema. E eles querem reduzir ainda mais. Para nós, como sindicalistas, não faz sentido nenhum assinar um negócio desses”, alertou Felipe.

A luta pelo mínimo

Não precisava ter sido assim. Até aqui, as tentativas de diálogo – que se esgotarão na próxima sexta-feira – foram completamente inviabilizadas por uma postura que, na superfície, se afirmava como técnica, mas que, na realidade, é absolutamente ideológica.

Muitas vezes, segundo Felipe, a lógica neoliberal é tamanha, que a própria razão é deixada de lado. “Eles propõem um novo Plano de Cargos e Salários. Nós entendemos. É normal que queiram fazer mudanças. Mas a empresa quer fazer isso sem dialogar com os trabalhadores. Querem que nós assinemos o ACT concordando com um novo plano de cargos e salários ao qual não tivemos acesso, que desconhecemos completamente. Cada cláusula deste acordo precisa ter um pró e um contra para cada um dos lados. A gente só tem lidado com o contra nesta história. A grande dificuldade desses gestores é a questão da apatia. Eles não conseguem se colocar no lugar do trabalhador que eles estão liderando. É uma incapacidade de empatizar com o outro que beira à psicopatia”, alertou Felipe.

A audiência de conciliação da última sexta-feira terminou com a marcação do novo encontro, em 30/08, quando já serão estabelecidos os primeiros prazos para o julgamento de fato. É sinal de que, caso não haja acordo em 30/08, o processo seguirá para julgamento. Segundo Felipe, a categoria tem sinais dúbios em relação o que poderá ser decidido pelos ministros do TST. 

“Temos um ministro muito bom, Maurício Godinho Delgado, progressista, que não tem uma visão patronal. Mas também existe o entendimento de que conquistamos avanços. E houve, mas não em relação à proposta dos trabalhadores, mas em relação à proposta da empresa, ancorada lá atrás. Nós, os sindicalistas, estamos sempre cedendo para alcançar o consenso. Então, o que para a empresa é um avanço, para nós é um recuo menor”, apontou Felipe. 

O diretor do Senge RJ destacou que sempre há esperança no diálogo, mas que é a coragem que segue impulsionando o CNE: “Esperamos que a empresa tenha uma proposta para que a gente não vá a dissídio coletivo de greve. Porém, se tiver que chegar a isso, não vemos problema nenhum. A gente vai seguir nesta luta até onde ela chegar. Porque o nosso dever, como sindicalistas, é defender o trabalhador, não fazer a gestão do caos”, finalizou.

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