por Jorge Folena*
O ano de 2025 mal começou e já se mostra decisivo para o campo democrático, popular e progressista no Brasil. E o presidente Lula, no inicio da sua entrevista coletiva de 30 de janeiro, afirmou que este ano será o mais importante para o governo derrotar a mentira e fazer prevalecer a verdade: “estou pronto para derrotar a mentira e salvar a democracia”.
Por isso, ressalto que nossa maior luta no país, atualmente, é contra o fascismo, presente em vários setores da sociedade e amplamente alimentado pela mídia tradicional, a serviço da classe dominante financista e neoliberal.
Beira o lugar comum dizer que, com o emprego massivo das redes sociais, a manipulação e a mentira são utilizadas conforme os interesses políticos da classe dominante, que se vale de técnicas empregadas pelos fascistas no início do século XX, de acordo com os meios de comunicação daqueles tempos (rádios e jornais).
Essas mesmas táticas se repetem no presente, como farsa destrutiva de valores materiais e morais, como temos observado, aqui no Brasil, desde o golpe contra a presidente Dilma Rousseff e que se exacerbaram no processo eleitoral de 2018.
Assim, a finalidade deste texto é analisar a jurisprudência do STF relativa aos casos de abusos praticados por parlamentares, no emprego da sua liberdade de expressão, diante do instituto da imunidade parlamentar.
Digo isto porque quem mente, desinforma e distorce a realidade não pode ficar impune. No Brasil, de acordo com a Constituição e segundo a interpretação dada pelo STF, tem imperado o binômio “liberdade com responsabilidade” na apuração dessas questões.
Ocorre que deputados e senadores de viés fascista têm divulgado inverdades ou empregado meios ardilosos para desinformar e impor o pânico no meio da sociedade, e o fazem na crença de estarem protegidos pela cláusula da imunidade parlamentar, que, em tese, os deixariam isentos de responsabilidades civil ou criminal.
O instituto da imunidade parlamentar tem por fim “a garantia do adequado desempenho das funções de fiscalização dos atos praticados pelo poder público, de criação das leis e do debate de ideias essenciais ao desenvolvimento democrático”, como registrado pelo STF, no julgamento do Recurso Extraordinário 600.063 (relator ministro Luís Roberto Barroso), de modo que os congressistas possam atuar sem pressões externas, no livre exercício das suas atividades legislativas.
Efetivamente, a Constituição prevê em seu artigo 53 que “os deputados e senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos.” Contudo, em diversas situações, a jurisprudência do STF tem afirmado que a imunidade parlamentar somente é alcançada nos casos de “nexo de vinculação recíproca com a função parlamentar” (Pet 6.156, Inq. 2.874, RE 600.063).
Nesse ponto, é importante registrar o que esclareceu o ministro Celso de Mello no julgamento da Questão de Ordem no Inquérito 1.024: a imunidade parlamentar “não se pode mostrar absoluta, nem se estende a qualquer declaração do congressista, pois o alcance normativo do preceito constitucional abrange, unicamente, as manifestações vinculadas ao exercício do mandato legislativo ou feitos em razão deste”.
Em idêntico sentido, o ministro Luiz Fux expressou que a imunidade “não confere aos parlamentares o direito de empregar expedientes fraudulentos, artificiosos ou ardilosos, voltados a alterar a verdade da informação” (Pet. 5.705).
Diante disso, os parlamentares não estão imunes à responsabilidade pessoal, seja de natureza civil ou criminal, em decorrência de atos desvinculados das suas funções parlamentares, como fez o deputado que, recentemente, utilizou as redes sociais para disseminar o pânico no país, apresentando um questionamento dissimulado sobre uma falsa cobrança de imposto de renda na utilização do PIX pela população, em operações acima de cinco mil reais.
Este fato traz ao debate a necessidade de as autoridades buscarem a responsabilização de parlamentares fascistas, que se valem da sua posição para expor e atacar grupos sociais, propagar o ódio e divulgar mentiras, mas que, ao final, depois de todo o desgaste, por não receberem qualquer punição, mantêm a população no erro ou na desinformação.
Entendo que, independentemente de as autoridades tomarem ou não medidas contra esses fascistas, as entidades da sociedade civil deveriam ingressar com ações civis públicas para responsabilizar por danos morais coletivos tais indivíduos, além de exigir do Ministério Público a propositura de ações criminais, de modo a não permitir a consolidação da impunidade.
Infelizmente, o que constatamos é que a classe dominante e as autoridades brasileiras são tolerantes com os fascistas, e o exemplo mais claro disso nos remete aos integrantes da operação lava jato, que até hoje não foram responsabilizados pelos malfeitos e prejuízos causados ao país.
A recente cassação do mandato da deputada Zambelli, pelo TRE/SP, veio em boa hora, uma vez que o abuso de poder político pelo emprego da mentira reiterada não pode ser tolerado no ambiente político, como fazem diversos parlamentares de extrema-direita em suas campanhas eleitorais e nas suas práticas políticas.
Nenhum direito ou prerrogativa pode ser utilizado impunemente, à exaustão, para disfarçar ou justificar o desrespeito e os ataques reiterados à coletividade, às instituições e às regras basilares sobre as quais se equilibra o estado democrático de direito. Diante dessa constatação, pergunto: quando Nikolas será duramente responsabilizado?
* Folena é advogado e cientista político. Secretário geral do Instituto dos Advogados Brasileiros e Presidente da Comissão de Justiça de Transição e Memória da OAB RJ, Jorge também coordena e apresenta o programa Soberania em Debate, do movimento SOS Brasil Soberano, do Senge RJ.