O deputado federal Reimont Otoni (PT/RJ) é parte de um Congresso recentemente taxado como “inimigo do povo”. Fala com dor sobre a experiência porque, ainda que faça parte dele, concorda com a pecha e, mais que isso, acompanha de perto, no cotidiano, a absoluta normalidade com que o Legislativo vem atuando abertamente, sem vergonha alguma, contra os interesses do povo brasileiro.
Na queda de braço dentro da Câmara, os partidos do campo da esquerda — PT, PSOL, PCdoB, PSB, PV, PDT —, com apenas 130 dos 513 deputados, fazem o possível para barrar projetos como o inacreditável PL da Devastação, aprovado na Câmara e piorado no Senado. Eles convivem em um ambiente que, segundo Reimont, lembra um recreio da quinta série. Parlamentares da extrema-direita chutam os adversários políticos no plenário; do púlpito, os desafiam para brigas.
“O nível é muito baixo. O deputado Sóstenes Cavalcante, do PL, no mesmo dia em que a tarifa de 50% para a importação de produtos brasileiros foi anunciada por Donald Trump, aprovou uma moção de louvor e aplausos para o presidente norte-americano. Isso aconteceu na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional. Na votação do PL da Devastação, às 3 da manhã, um deputado militar afirmou que votava favoravelmente porque era parte da bancada do boi, da bala e da bíblia, e que estava ali para isso. Ouvir isso no meio da madrugada é entender por onde este Congresso caminha hoje. Para ficar mediano, precisará melhorar muito”, lamenta.
O convidado do programa Soberania em Debate do dia 17/07, presidente da Comissão de Direitos Humanos, Minorias e Igualdade Racial da Câmara dos Deputados e coordenador da Frente Parlamentar em Defesa da População em Situação de Rua, lamenta profundamente a situação.
“Como eu queria que o Congresso do qual faço parte estivesse alinhado com o povo brasileiro, preocupado em cuidar dos mais empobrecidos, do nosso planeta, da saúde, da educação, da distribuição de renda, com a reforma agrária e urbana. Mas ele não está. E, por isso, faz jus à tarja de ‘inimigo do povo’. É com muita dor que eu faço essa análise, porque luto contra isso há 17 anos. Luto pela qualificação da atividade política, responsável por tudo de bom e de ruim, de digno ou infeliz que há na vida das pessoas”, destaca Reimont.
Devastação legislativa
Há, segundo o parlamentar, um raciocínio equivocado na raiz da atuação antipovo do Congresso Nacional. Focados em derrotar o governo Lula, os parlamentares atuam cotidianamente contra o povo brasileiro.
No último dia 17 de julho, mesmo sob forte pressão popular, a Câmara dos Deputados adentrou a madrugada para ver aprovado, pelo centrão e pela direita, o PL da Devastação, que desmonta as regras do licenciamento ambiental no Brasil. Segundo especialistas — que embasaram o voto contrário dos partidos do campo progressista —, o projeto “abre a porteira para a passagem da boiada”, um projeto antigo do bolsonarismo. O retrocesso, chancelado por 267 deputados, propiciará o aumento do desmatamento e da poluição, o agravamento da crise sanitária e dos desastres naturais.
“Temos um histórico no Rio de Janeiro, de Petrópolis, Teresópolis, Nova Friburgo, Belford Roxo, Duque de Caxias, onde as grandes tempestades causaram enormes inundações e desmoronamentos, levando a muitas mortes. Não podemos esquecer o que foi o Rio Grande do Sul, Brumadinho e Mariana. Quando o Congresso abre mão do licenciamento ambiental, ele vota pela repetição de tudo isso. Se o Congresso não se preocupa com a diminuição da desigualdade, com a preservação ambiental, com a nossa soberania, tenho que admitir e aceitar o carimbo que a sociedade está colocando nele. É uma pena. Me causa dor. Gostaria muito de poder dizer que, desta vez, o povo está errado, mas ele não está.”
Agora, a expectativa é de que o presidente Lula vete o projeto, que praticamente rasga o Acordo de Paris e coloca em dúvida a coerência do Brasil ao sediar a COP30. Após o veto, haverá luta. Reimont destaca que será preciso grande pressão social para que o veto não seja derrubado.
A única alternativa: o voto consciente
Há uma história que conta que, certa vez, o Dr. Ulysses Guimarães foi abordado por um cidadão que disse que a composição do Congresso era muito ruim. A isso, Ulysses respondeu: “Espere até ver a próxima.” A fala, atribuída ao maestro da redemocratização do país, segue se cristalizando como regra — mas isso precisa mudar. Reimont destaca que a única saída para o gravíssimo estado do Congresso Nacional está nas urnas, no voto consciente.
“Quando Hugo Mota diz que o governo terá problemas com o Congresso em 2026, ele está sendo coerente, mas está errado. Ele deveria estar promovendo um alinhamento para pensar o Brasil. Porque, quando o Congresso pensa que está derrotando o governo Lula, ele está enganado. Está jogando contra o povo, contra os nossos biomas, contra a nossa própria sobrevivência neste planeta. Minha expectativa é que o povo brasileiro não reeleja os Bolsonaro. Não reeleja os deputados do centrão e da extrema-direita, que são, sim, inimigos do povo. Precisamos derrotar esses deputados e senadores em 2026”, conclamou Reimont.
O programa Soberania em Debate, projeto do SOS Brasil Soberano, do Sindicato dos Engenheiros no Rio de Janeiro (Senge RJ), é transmitido ao vivo pelo YouTube, todas as quintas-feiras, às 16h. A apresentação é da jornalista Beth Costa, com assessorias técnica e de imprensa de Felipe Varanda e Lidia Pena, respectivamente. Design e mídias sociais são de Ana Terra.
O programa também pode ser assistido pela TVT, Canal do Conde, e é transmitido pelas rádios comunitárias da Associação Brasileira de Rádios Comunitárias – Abraço Brasil.
Senge RJ | Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado