Fonte: Brasil de Fato
A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 55 (antiga PEC 241), que institui o Novo Regime Fiscal, começou a ser discutida em plenário nesta quinta-feira (17), e a ideia de incluir um referendo popular no texto final da proposta vem movimentando parlamentares contrários à matéria nos bastidores da Casa. A sugestão conta com a simpatia de segmentos da sociedade civil organizada.
Inicialmente, a ideia surgiu no âmbito da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), por sugestão de senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR). Ela apresentou uma emenda solicitando que, em caso de aprovação no plenário, a medida não entrasse em vigor sem ter aprovação em referendo.
O referendo, assim como o plebiscito, é previsto no artigo 14 da Constituição Federal de 1988 para casos que tratam de matérias consideradas de relevância para o país em aspectos constitucionais, legislativos ou administrativos. No caso do plebiscito, a consulta se dá antes da criação da medida; já o referendo é realizado após a aprovação da norma.
Segundo a proposição, em caso de reprovação pela população, a emenda constitucional não surtiria efeito. No entanto, a sugestão foi rejeitada pelo relator da matéria na Casa, Eunício Oliveira (PMDB-CE), bem como as outras 58 emendas à PEC apresentadas no colegiado.
O prazo final para recebimento de sugestões de alteração se encerra na próxima quarta-feira (23). Até lá um grupo de senadores se articula em busca de apoio para apresentar uma emenda que insira o referendo na redação da matéria. A previsão é que o primeiro turno da votação aconteça no dia 29 deste mês
Os opositores da PEC 55 tentam agora articular uma nova emenda para o trâmite em plenário. Para que ela seja oficializada, são necessárias 27 assinaturas, o equivalente a 1/3 do número total de senadores, e 49 parlamentares precisariam votar favoravelmente ao referendo quando a matéria for lançada à consulta em plenário.
A ideia conta com o empenho de parlamentares do PT, da Rede, do PCdoB e de expoentes de outros partidos, como o senador Roberto Requião (PMDB-PR).
“O governo que está aí não foi eleito, não tem respaldo popular e está colocando uma proposta que não foi aprovada pelas urnas. Nada mais justo e lógico do que consultar o povo sobre isso, até porque se trata de uma mudança na Constituição Federal que durará 20 anos, coisa que país nenhum no mundo fez”, defendeu a senadora Regina Sousa (PT-PI) em entrevista ao Brasil de Fato.
O grupo de parlamentares que defendem o referendo deve começar nos próximos dias uma campanha direcionada à sociedade. Nesta sexta-feira (17), entrará no ar o site www.naoapec55.com.br, que trata da divulgação da proposta.
O Senado Federal tem feito uma consulta pública virtual para saber se os internautas apoiam a PEC 55. Até o momento, foram registrados pelo sistema 337.373 votos contrários e 22.189 votos favoráveis.
Sociedade civil
Com a iminente aprovação da PEC 241 no plenário do Senado – a matéria foi aprovada na CCJ por um placar de 19 votos a 7, no último dia 9 –, segmentos da sociedade civil organizada têm se mostrado favoráveis à ideia de realização do referendo.
Para Luiz Dalla Costa, da coordenação nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), a proposta de consulta à população enfrentará grandes dificuldades de aprovação, mas precisa ser colocada em discussão.
“Em primeiro lugar, é importante ressaltar que seremos sempre contra a PEC, mas, olhando a situação do Congresso hoje, sabemos das chances de aprovação e achamos interessante a proposta de referendo. Queremos que a sociedade faça esse debate, que todos os detalhes sejam esclarecidos e que as pessoas possam manifestar sua opinião. O parlamento precisa se colocar nessa posição de ouvir mais a sociedade. Inclusive, se houvesse um governo de caráter popular, que ouvisse os movimentos sociais, essa PEC nem existiria, porque ela vai contra os interesses da maioria do povo”, avaliou o dirigente.
A professora universitária Tatiana Roque, membro do movimento “Brasil 2036”, de oposição à PEC, acredita que uma eventual consulta à sociedade apontaria para uma grande chance de fracasso do interesse governista. “O referendo é uma excelente ideia porque a população costuma ser sensível às pautas da saúde e da educação pública, que nós sabemos que serão fortemente afetadas pela PEC. Então, certamente o governo perderia”, calcula.
Ela avalia que a ansiedade política dos parlamentares que lutam pela aprovação célere da matéria não estaria em consonância com os interesses populares.
“Ao invés de tornarem o debate mais democrático e ampliado, eles fazem exatamente o oposto, tentando aprovar rápido e de maneira pouco clara, pra marginalizar a sociedade. (…) Esse parlamento que está aí é pouco representativo e está completamente desmoralizado, sem qualquer relação de confiança com a população. É preciso que haja mais diálogo com as forças populares”, considera a professora, que também é presidenta do Sindicato dos Docentes da Universidade Federal do Rio de Janeiro (ADUFRJ).
Governistas
A ideia de realização do referendo tem sido rechaçada por parlamentares da base governista não só no Senado, mas também na Câmara Federal. Para o deputado Darcísio Perondi (PMDB/RS), que foi relator da matéria na Casa, a consulta prejudicaria o país.
“O atual governo tem um ‘cheque especial’ enorme, de quase R$ 200 bilhões este ano, e mais uma dívida brutal. (…) O referendo custa muito e atrasaria a recuperação de um paciente grave, que são as contas do governo federal”, argumentou o peemedebista.
Ele acrescentou que a base governista tem a PEC 55 como uma prioridade em termos de celeridade na apreciação, além das reformas trabalhista e da Previdência, que nos próximos meses devem agitar ainda mais a arena do Congresso.
Edição: Camila Rodrigues da Silva