Maior redução de juros ajudaria a superar o terrorismo econômico no Brasil

Ao abordar o elevado patamar da taxa Selic, em fevereiro, na época, ainda em 13,75% – o ciclo de queda só começaria seis meses depois, em agosto -, o presidente Lula destacou a necessidade de superar a cultura dos juros altos. Durante a cerimônia de posse de Aloizio Mercadante na presidência do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), o presidente afirmou que “o problema não é o BC (Banco Central) independente ou ligado ao governo, mas a cultura do país de viver com juros altos, que não combina com a necessidade de crescimento que nós temos”.

Para Juliane Furno, assessora da presidência do BNDES e professora da Faculdade de Ciências Econômicas da UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), essa cultura tem nome: terrorismo econômico

Segundo ela, é difícil encontrar outra explicação para a lenta redução de 0,5% a cada reunião do Copom (Comitê de Política Monetária) desde agosto. “Mesmo na lógica liberal e neoclássica dos dirigentes do BC, não faz sentido um ato tão conservador de ir reduzindo a taxa básica de forma tão lenta. Eles mesmos identificaram que há um ‘hiato de produto’, ou seja, há uma diferença entre o que estamos usando de capacidade produtiva instalada e o PIB potencial, que é o potencial de crescimento da economia”. Este hiato, segundo a professora, seria motivo suficiente para uma política mais expansionista, abaixo do juro neutro, que nem estimula nem contrai a economia.

Cautela para quem?

Fixada em 13,75% ao ano desde julho de 2022, a estabilidade da Selic manteve o Brasil no topo do ranking dos juros no mundo. Mesmo após o início do ciclo de cortes, o país segue na liderança entre aqueles com a maior taxa de juros reais do planeta.

Embora o nível da Selic nas alturas refreie os investimentos e impeça o crescimento econômico, nem todos saem perdendo. Juliane, que é socióloga e economista, mestre e doutora em Desenvolvimento Econômico, destaca que, embora seja um debate complexo e profundo, em resumo, ganham aqueles que vivem de renda de títulos públicos e empregadores que garantem o lucro com baixos salários.

“Além daqueles que ganham uma remuneração elevada apenas deixando capital parado na dívida pública, a depender do ciclo econômico, os capitalistas produtivos também podem se beneficiar dos juros altos.  Se, por um lado, os juros elevados representam um alto custo de capital, por outro, quando há juros mais elevados há uma tendência de perda de tração da economia, com baixo crescimento, elevado desemprego e, por conseguinte, salários mais baixos. Portanto, se o custo da força de trabalho estiver muito elevado, faz sentido o dono de uma fábrica exigir juros altos, porque isso forçará seus custos pra baixo, aumentando margem de lucro”, explica a professora.

Prática e perspectivas

A última reunião do Copom, em 12 e 13 de dezembro, voltou a cortar conservadores 0,50 ponto percentual na Selic. Com isso, 2023 fecha em 11,75%, retornando ao patamar de março de 2022. A taxa destoa de um cenário nacional que surpreendeu o mercado no terceiro trimestre, quando a projeção do crescimento econômico do país foi reajustada de 0,9% para 3%, puxada por indicadores positivos, como a abertura de empregos formais na casa dos 2 milhões para este ano.

A taxa em um dígito, reivindicada pelos sindicatos e movimentos de trabalhadores, segundo as projeções, só deve ser alcançada no final de 2024, quando deverá bater em 9,25%. Para o final de 2025, o valor da Selic deverá estar, segundo analistas, em 8,5%. Só então, explica Furno, estaríamos chegando próximo do nosso limite de corte, diretamente atrelado à taxa de juros norte-americana.

“Imagino que 8% esteja próximo do nosso limite. Considerando uma inflação de 5%, isso significa 3% de juro real. Digo que se aproxima do teto porque o Brasil, como uma economia dependente e subdesenvolvida, que ocupa um espaço inferior na hierarquia de moedas, não pode ter uma taxa básica de juros inferior à taxa norte americana acrescida de uma prêmio de risco. Esse é um limite estrutural. Se houver uma queda mais bruta que isso o Brasil pode sofrer as consequências de uma fuga de capitais, gerando desvalorização cambial e inflação”, explica.

Com a manutenção da taxa de juros estadunidense no intervalo entre 5,25% e 5,50% determinada pelo Fed (Federal Reserve, o BC dos EUA), também em dezembro, fica estabelecida uma amplitude entre os indexadores de 6,25%. A diminuição dessa distância, rumo a um equilíbrio entre as taxas, deverá repercutir em investimentos na produção de bens e serviços, atividades não-especulativas, impulsionando a economia brasileira. A morosidade nesse processo, no entanto, engessa o país.

Para Furno, a cultura dos juros altos, o “terrorismo financeiro”, só poderá ser superado com provas práticas de que a economia seguirá em crescimento, sem aumento da inflação, com a Selic em patamares mais baixos. “Estamos acostumados a viver sob uma economia de juros elevados. Há terrorismo econômico em relação a isso, como se a queda dos juros fosse levar à inflação. Acho que precisamos enfrentar isso, reduzindo juros e demonstrando o ciclo positivo sobre o investimento e o emprego”, finaliza.

 

Texto: Rodrigo Mariano/Senge RJ
Com informações da Agência Brasil
Fotos: Marcello Casal Jr./Agência Brasil; YouTube/Reprodução e Rafa Neddemeyer/Agência Brasil

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