O Sindicato dos Engenheiros no Estado do Rio de Janeiro (Senge RJ) defende a aplicação do conhecimento técnico da engenharia e também a mobilização da força política da categoria para buscar a retomada no estado dos investimentos públicos em políticas de moradia e urbanização, a nível municipal, estadual e federal. Para o Crea-RJ, além de uma campanha de massa pelo descarte correto do lixo, são necessárias ações que melhorem a drenagem e o escoamento das águas, evitando a ocupação desordenada das encostas.
“É muito importante que as entidades e os profissionais da engenharia se posicionem e ajam como agentes políticos na cobrança e na formulação de propostas de políticas públicas para, no curto e longo prazo, atenuar e superar a condição de calamidade que chuvas fortes trazem ao Rio de Janeiro”, afirmou Pedro Monforte, diretor do Senge RJ. Na avaliação do dirigente, a precariedade das condições de vida nas comunidades – agravada na incidência de chuvas fortes – reflete racismo ambiental e falta de prioridade política.
“Todos os anos, vemos esses desastres acontecerem nas periferias – no Rio de Janeiro, especialmente nas favelas –, como consequência de falta de infraestrutura básica urbana, que por sua vez decorre da ausência de políticas públicas para essa população”, critica o diretor do Senge RJ. “As favelas são espaços que foram ocupados na nossa cidade por uma fração grande do povo pobre e negro, que saiu do regime de escravidão e não foi incluído na estrutura social com acesso pleno a todos os direitos, entre eles o direito à moradia digna e à infraestrutura urbana. Estamos falando de racismo ambiental, crime advindo de negligência histórica do Estado brasileiro.”
O dirigente observa que, desde o golpe que afastou a presidenta Dilma Rousseff em 2016, praticamente não houve mais política pública de moradia, habitação, urbanização, em todas as escalas. “Por isso, é urgente e necessária a retomada das grandes obras nesse setor. Como engenheiros, devemos nos solidarizar com as pessoas que sofrem com as chuvas e pressionar para pôr em andamento um processo não só de construção de infraestrutura mas também voltado à regularização fundiária, porque grande parte da população é obrigada a morar em áreas de risco, pela falta de moradia digna.”
Na quarta-feira (8), quando houve a chuva mais forte, das 162 sirenes instaladas em comunidades da cidade que ficam em áreas de risco de deslizamento, pelo menos 113 foram acionadas, segundo a Prefeitura do Rio de Janeiro. Segundo Pedro Monforte, estima-se, de modo geral, que um quarto da população carioca more em regiões de favela.
As recomendações do Crea-RJ
As ocupações de encostas, em especial aquelas feitas de forma desordenada, são uma grande preocupação, avalia o presidente do Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Crea-RJ), Luiz Antonio Cosenza, que apresentou considerações sobre a questão levadas à presidência da entidade pelo engenheiro civil Luiz Carneiro, coordenador da Câmara Especializada de Engenharia Civil. Na questão das drenagens, distinguem-se em três abordagens: a macrodrenagem (rios e canais, e galerias tronco); macrodrenagem e drenagem de superfície.
No caso das macro-drenagens, o presidente do Crea-RJ alerta que, em consequência da ocupação das encostas e da “supressão vegetal” (corte das matas), o tempo das águas de chuva para ‘chegar ao vale’ diminuiu muito (o chamado coeficiente de runoff fica cada vez maior). “Na prática, dizemos que as florestas se comportam como uma toalha, retendo as águas de chuva e as ‘soltando’ aos poucos. Se temos menos florestas e mais solo impermeabilizado, temos um grande problema de drenagem: as águas de chuva estão chegando muito mais rápido nos vales”, explica.
Outro complicador, diz Cosenza, deriva da expansão da cidade, o que requer várias medidas de ajuste. “A cidade se espraiou, tanto na região do Porto do Rio, como no Centro, na Zona Sul (Glória, Flamengo, Botafogo, Copacabana , etc.). Nestas regiões, as tubulações de drenagem foram estendidas em nível, diminuindo a vazão teórica e facilitando o assoreamento. Então, no que tange à macro-drenagem, onde couber, temos que aumentar as seções de vazão, limpar (dragar) periodicamente os canais e galerias, retirar as obstruções eventuais.”
Ele propõe, ainda, concluir o projeto dos piscinões nas bacias dos rios Maracanã e Joana; e implantar o projeto do Túnel Extravasor da Zona Sul, iniciado nos anos 70, que captaria as águas excedentes dos rios Rainha, Cabeças e Macacos, eliminando as grandes enchentes das ruas Jardim Botânico e Pacheco Leão. O presidente do Crea-RJ observa que, com exceção dos piscinões dos rios Maracanã e Joana, desde o governo Carlos Lacerda, nos anos 1960, não há investimentos relevantes em drenagem no Rio de Janeiro.
“Não são admissíveis enchentes na rua Voluntários da Pátria, em Botafogo, onde foi projetada e construída uma grande galeria que canalizou o Rio Berquó. E, onde, há alguns dias, vimos na Prefeitura do Rio de Janeiro que as galerias que deveriam conduzir as águas pluviais para o rio Berquó não estão ligadas, prejudicando a drenagem da rua”, criticou Cosenza, que aponta também a necessidade de inspeção no Rio Carioca e do Rio Papa-Couve, no Catumbi.
Com relação à microdrenagem, o engenheiro recomenda revisão e limpeza em todas as galerias, observando o diâmetro mínimo dos ramais de ralo (400 mm) e o espaçamento máximo de 25 metros entre as caixas de ralo. “Todo o ponto de curva e de tangência precisa ter uma caixa de ralo instalada. E é necessário revisar toda a declividade das sarjetas, para que a água da chuva deságue efetivamente para o ralo”, diz.
Finalmente, o presidente do Crea-RJ defende o lançamento de uma nova campanha massiva, de grande escala, contra o descarte inadequado de lixo. Ou seja, uma ação que reforce a mensagem “mantenha a cidade limpa”.
Foto: Sambódromo inundado (8/2/2023) – reprodução de vídeo em https://www.instagram.com/reel/CoYBc8ljlyu/?utm_source=ig_web_copy_link