(Foto: Giorgia Prates)
Por Ednubia Ghisi – Comunicação Senge Paraná
“Se chegássemos no estágio capitalista, já seria um avanço, porque hoje a comunicação no Brasil está no feudalismo”. A afirmação é da jornalista Bia Barbosa, secretária-geral do Fórum Nacional Pela Democratização da Comunicação (FNDC) e integrante do Intervozes, durante o IV Simpósio SOS Brasil Soberano, realizado em Curitiba nesta sexta-feira (14). A ação é iniciativa da Federação Interestadual de Sindicatos de Engenheiros (Fisenge) e do Sindicato dos Engenheiros do Rio de Janeiro (Senge-RJ), que na capital paranaense também foi realizada pelo Sindicato dos Engenheiros do Paraná (Senge-PR).
A relação com o sistema feudal, de acordo com a jornalista, se expressa pelo controle territorial exercido por grupos empresariais de comunicação, que controlam o poder político e econômico local. Como resultado, este cenário gera “coronéis eletrônicos”, figuras públicas com grande influência na região.
De acordo com dados apresentados pela integrante do Intervozes, na composição atual do Congresso Nacional 32 deputados federais e oito senadores controladores diretos de concessões públicas de radiodifusão. Esta realidade vai de encontro ao artigo 54 da Constituição Federal de 1988, que proíbe deputados e senadores de terem concessão de TV ou de rádio. O “coronelismo eletrônico” viola ainda o pluralismo político e o direito à cidadania, expressos no artigo 1º, e o princípio da isonomia, previsto no artigo 5º.
Comunicação soberana
A reflexão sobre a radiodifusão e telecomunicações, segundo Bia Barbosa, é imprescindível para um projeto de soberania nacional. “Democracias em todo o mundo entendem a necessidade de reger as políticas de comunicação a partir do interesse público”. Mas isso não ocorre no Brasil, explica a militante: “Nosso país, infelizmente, construiu um sistema de radiodifusão na contramão dessa lógica, concedeu concessão basicamente para o mercado”, lamenta a jornalista.
Há previsão constitucional para complementariedade dos sistemas de comunicação, isto é, equilíbrio entre o espaço dado à comunicação pública (sem fins lucrativos), estatal (para dar transparência ao que ocorre nos três poderes da república), e à privada (formada pelas empresas particulares, que visão lucro).
Mesmo durante os governos do Partido dos Trabalhadores, ela aponta ter faltando “visão estratégica” da centralidade de comunicação pública, por exemplo. “Passamos os últimos 15 anos sem enfrentar a concentração na mídia no Brasil, sem avançar o suficiente na comunicação pública, e fragilizando a comunicação comunitária. Atualmente há 5 mil comunicadores populares respondendo processos no Brasil”.
A criação da Empresa Brasil de Comunicação é apresentada pela militante como uma tentativa relevante feita pelo governo Lula, mas que está em processo de desmonte desde o início do governo Michel Temer (PMDB). “É um quadro absurdo de censura interna. O que a EBC tem feito é comunicação governamental, e não comunicação pública”, denuncia.
Telecomunicações em mãos privadas
Com relação à internet, Bia Barbosa aponta que, apesar de ser um espaço de pluralidade e diversidade, mais de 50% da população brasileira não tem acesso. “E, não por acaso, é a população mais pobres que está excluída do acesso à internet”.
Ela alerta para a gravidade do cenário atual das telecomunicações: o setor é dominado por empresas privadas estrangeiras. O pouco de infraestrutura pública que restou do processo de privatização, ocorrido durante o governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), na década de 1990, corre um risco de ser transferido do Estado para o setor. “São 100 bilhões em infraestrutura de telecomunicações de passivo da privatização”.
O Projeto de Lei que pretende autorizar este “presente” às multinacionais está paralisado e judicializado, como consequência da mobilização dos movimentos de comunicação.
Outro favorecimento explícito ao setor privado, em detrimento do interesse pública, é a intenção do governo Temer em privatizar um satélite recém-lançado no espaço, que tinha como objetivo levar acesso à internet a regiões ainda não alcançadas.
Centralidade da comunicação – na prática
Para transformar este cenário desfavorável, Bia Barbosa sugere que a pauta deve ocupar espaço de centralidade para as organizações e sindicatos: “Não pode ficar restrita ao campo dos jornalistas. Precisamos ampliar a pauta e fazer chegar até a população, para que ela saiba que também tem direito de reivindicar. No campo da comunicação não há essa consciência de que também é um direito”.
Propõe também a retomada de um debate sobre um novo marco regulatório convergente entre telecomunicações e radiodifusão, em paralelo à resistência feita atualmente pela democracia, diante dos inúmeros retrocessos impostos pelo governo Temer. “Não estaríamos como estamos hoje se tivéssemos enfrentando a questão da concentração de mídia no Brasil”, garante.
Além disso, aponta a importância de fortalecer as ferramentas de comunicação popular e alternativa, que tem avançado como instrumentos de contrainformação. “A centralidade da comunicação está na boca de 10 e cada 10 militantes e dirigentes sindicais, mas não ocorre na prática das ações”, provoca.