Reeleita com mais de 49 mil votos para o segundo mandato na Câmara Municipal do Rio de Janeiro, a vereadora Tainá de Paula (PT) se consolidou como uma das principais lideranças da esquerda na capital fluminense. Ao Brasil de Fato, ela falou sobre seus planos para o próximo ciclo da política no país: “Quero muito ser prefeita do Rio de Janeiro.”
Mulher mais votada para a Câmara Municipal do Rio de Janeiro nas eleições de 2024, de Paula explicou sua pretensão ao BdF Entrevista desta semana.
“Acho que não é um movimento necessário apenas para a esquerda, mas para toda a cidade. Nós viemos de um governo do César Maia, sujeito que respeito, mas é um sujeito ultraliberal. Ele passa o bastão para o Eduardo Paes, por quem eu sou apaixonada, mas que é um sujeito ligado a setores econômicos poderosos da cidade e dialoga muito com esses setores, que o limitam de fazer uma gestão mais progressista. Acho que é o momento de fazermos uma renovação no caldo”, explicou a vereadora.
Tainá de Paula sofreu um atentado no dia 3 de outubro deste ano, há três dias da votação do primeiro turno. Seu carro foi baleado, mas a parlamentar e seu motorista não sofreram nenhum ferimento, pois o veículo era blindado.
“Eu só não fui interrompida como Marielle Franco porque eu aprendi, talvez a esquerda não tenha aprendido, mas as parlamentares negras aprenderam que hoje não tem condições de andar com um carro que não seja blindado na cidade do Rio de Janeiro, é inviável. Isso é uma interrupção da minha liberdade, da minha forma de fazer política e de circular pela cidade. Poucas parlamentares negras vão conseguir se reeleger nos próximos anos, porque é uma campanha mais cara e mais insegura”, lamenta Paula.
Confira alguns trechos da entrevista (a íntegra você pode conferir no vídeo acima):
Brasil de Fato: Há um apelo no Rio de Janeiro para que o PT volte a ter uma candidatura competitiva depois de tantos anos. Eu quero saber se esse apelo já chegou até você e se passa pela sua cabeça ser candidata à Prefeitura do Rio de Janeiro.
Tainá de Paula: Quero muito ser prefeita do Rio de Janeiro. Acho que não é um movimento necessário apenas para a esquerda, mas para toda a cidade. Nós viemos de um governo do César Maia, sujeito que respeito, mas é um sujeito ultraliberal. Ele passa o bastão para o Eduardo Paes, por quem eu sou apaixonada, mas que é um sujeito ligado a setores econômicos poderosos da cidade e dialoga muito com esses setores, que o limitam de fazer uma gestão mais progressista. Acho que é o momento de fazermos uma renovação no caldo, no extrato político do Rio de Janeiro, e gostaria de ser uma figura estratégica para esse processo acontecer. Mas eu sou muito cautelosa sobre o movimento que o PT precisa fazer no próximo ciclo e eu não quero ser lulista nesse processo. O Lula sempre teve o Rio de Janeiro como coringa: “O que o MDB quer?”, “O que o PSD quer?” Será que o Rio de Janeiro serve para resolver a conjuntura nacional e virou uma moeda de troca? Será que em 2028 estaremos quitados com 2026? Tinha gente tampando o nariz com Geraldo Alckmin, não sei o que virá para o palanque de 2026.
Em 2018, uma vereadora negra foi executada. Neste ano, outra vereadora negra, liderança da política no Rio de Janeiro, sofrendo outra tentativa de execução. Por quê?
Eu só não fui interrompida como Marielle Franco porque eu aprendi, talvez a esquerda não tenha aprendido, mas as parlamentares negras aprenderam, que hoje não tem condições de andar com um carro que não seja blindado na cidade do Rio de Janeiro, é inviável. Isso é uma interrupção da minha liberdade, da minha forma de fazer política e de circular pela cidade. Poucas parlamentares negras vão conseguir se reeleger nos próximos anos, porque é uma campanha mais cara e mais insegura. Há um incômodo sobre o número de parlamentares negros eleitos no país. Eu vejo alguns intelectuais e dirigentes partidários fazendo artigos sobre o problema do voto racializado e como os parlamentares negros ganham relevância nesse processo. Esse voto é a reconexão com o sentido de Partido dos Trabalhadores no campo democrático popular. Se conseguimos organizar uma maioria negra que concentra votos num representante, assim como conseguimos organizar a classe trabalhadora que se via representada no cara de nove dedos nordestino, uma tática do velho populismo latino-americano das massas, que é tradição do nosso campo… se massacramos a formulação que faz com que a gente surja, a forma como nossas lideranças foram construídas, vamos combinar que vamos reinventar muita coisa. Me assusta que não se compreenda a estratégia de ter uma mulher negra como eu, que dialoga com mães negras de periferias, com jovens egressos do sistema prisional, que votaram no bolsonarismo em 2018 e votam em mim hoje.
Hoje, há 11 vereadores negros eleitos para a próxima legislatura, e apenas quatro são mulheres. Que reflexão você faz sobre esses dados?
São 51 cadeiras no Rio de Janeiro, apenas 11 negros e desses, apenas seis de esquerda. Então, temos alguns que sequer têm o debate racial como prioridade ou como agenda pública. O cenário é trágico, porque a gente tem alguns de fundo eleitoral [cotas], conseguimos tempo de televisão específico para candidaturas negras, conseguimos o aumento do financiamento de candidaturas de mulheres negras, mas existe uma estratégia muito clara de não fazermos uma reflexão sobre formação e consolidação dos quadros. Alguns quadros desistem da política na primeira eleição, após uma única derrota. Candidaturas da direita tentam até três vezes até conseguir um primeiro mandato. Tem vários candidatos negros que trabalham durante o dia e fazem campanha à noite, isso não é candidatura.
Fonte: Brasil de Fato | Texto: Igor Carvalho | Edição: Thalita Pires