Presidentes dizem o que esperam do novo governo

Valorização profissional, respeito ao piso e qualidade de ensino superior são demandas

Investimento no planejamento de longo prazo, valorização profissional, respeito ao piso salarial e garantia da qualidade do ensino superior técnico são as principais demandas que profissionais de engenharia e agronomia de 12 estados brasileiros esperam que sejam cumpridas pelo futuro governo do Brasil.

Profissionais de engenharia e agronomia defendem que o futuro governo invista no planejamento de longo prazo, valorize os quadros técnicos e respeite o salário mínimo profissional, sem perder de vista o cuidado com a qualidade do ensino técnico superior nas esferas público e privadas.

Estas são algumas das prioridades apontadas por presidentes de sindicatos de engenheiros de todo o Brasil no 10º Consenge, em Búzios, Rio de Janeiro, evento que reuniu entre os dias de 27 a 30 de agosto, perto de 400 profissionais em debates sobre o futuro do País. Questões, diretamente ligadas à defesa do interesse público e a setores estratégicos de desenvolvimento que têm a participação direta dos profissionais representados pelas entidades sindicais, integram a Carta do Rio de Janeiro que será encaminhada a cada um dos candidatos à Presidência da República.

O presidente do Sindicato dos Engenheiros no Estado do Paraná (Senge-PR) e ex-presidente da Federação Interestadual dos Sindicatos de Engenheiros (Fisenge) , Carlos Roberto Bittencourt, defende que o governo eleito esteja atento à recomposição dos quadros de engenharia nas escalas federal, estadual e municipal. “A valorização profissional é necessária. Hoje há a falta de engenheiros principalmente nos governos municipais. Sem engenheiros não há projetos e faltando projetos os municípios têm dificuldades para angariar recursos. É possível promover convênios com os estados e o governo federal para ter mais engenheiros nas prefeituras”.

 

Bittencourt entende que outra ação necessária de atenção do governo federal é a melhoria do ensino de engenharia. “Houve um processo de mercantilização da educação e muitas faculdades criaram cursos de engenharia sem ter condições de oferecer uma boa formação. Cabe ao Ministério da Educação exigir a qualidade do ensino técnico superior”.

Por último, o presidente do Senge-PR destaca a mobilidade urbana como prioridade de investimento dos três poderes. “Os trabalhadores levam muito tempo em deslocamentos de casa para o trabalho. Muitas vezes, o transporte é de má qualidade. Esta é uma questão ligada diretamente às prefeituras, mas que necessita de ampla atenção das três esferas de governo”.

Agricultura e acesso a terra – Para o presidente do Sindicato dos Engenheiros Agrônomos de Santa Catarina (Seagro-SC), engenheiro agrônomo Vlademir Gazoni, é preciso que o novo governo implante uma política agrícola que atenda à agricultura familiar e que dê sustentação à manutenção da engenharia como a base do planejamento com a definição de diretrizes de governo na área da agricultura. “São necessários investimentos direcionados à agricultura familiar, principalmente nos estados do Sul e do Nordeste, com ações que comecem desde o acesso a terra, com a promoção da reforma agrária ou através de crédito fundiário. Isso passa pelo financiamento que garanta a sustentabilidade e a rentabilidade dos agricultores para que tenham resultado social e financeiro”.

 

Gazoni ressalta ainda que essas medidas devem ser acompanhadas de ações de valorização profissional dos quadros que dão apoio à assistência técnica e extensão rural e na parte de fiscalização federal, estadual e municipal dos produtos de origem vegetal e animal. Essa valorização profissional, segundo ele, passa, obrigatoriamente, pelo atendimento do Salário Mínimo Profissional previsto na lei federal 4.950 A.

 

Carreira de Estado – Na opinião do presidente do Sindicato dos Engenheiros no Estado de Minas Gerais (Senge-MG), engenheiro eletricista Raul Otávio da Silva Pereira, a grande mensagem a ser enviada ao novo governo é a do reconhecimento da profissão de engenharia como carreira de Estado. “É importante que haja o reconhecimento da importância do papel do engenheiro nas ações integradoras de desenvolvimento do País. Os profissionais de engenharia devem ser valorizados como agentes condutores da maioria das políticas de desenvolvimento que os governantes pretendem implementar”, observa.

Pereira considera que a aprovação da engenharia como carreira de estado é necessária para consolidar este processo. “Entendemos que isto é fundamental, bem como a inserção de mais engenheiros nos quadros das prefeituras municipais é importante para que tenhamos um corpo técnico qualificado para acompanhar as políticas emanadas pelo governo federal que desembocam nas administrações dos municípios. Por fim, é preciso que haja o reforço, a confirmação e o reconhecimento definitivo da ampla validade da Lei 4950A/66 que trata do Salário Mínimo Profissional. É uma lei que vez ou outra é discutida. É um assunto que se arrasta e entendemos que é importante que haja um posicionamento definitivo e firme a respeito disso”.

 

O Projeto de Lei nº 13/2013 – que reconhece a Engenharia, a Agronomia e a Arquitetura como carreiras essenciais e exclusivas de Estado é de autoria do deputado José Chaves (PTB-PE). Já passou pela Comissão de Assuntos Sociais do Senado, tendo sido aprovado em agosto de 2013, e no momento aguarda votação pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), o que deverá ocorrer depois das eleições de outubro. Uma vez retornada à pauta e aprovada pela CCJ, se não houver recurso para votação pelo Plenário do Senado, nem mudança posterior no texto aprovado pela Câmara, a matéria será enviada direto à sanção presidencial.

As carreiras essenciais e exclusivas de Estado estão previstas pela Emenda Constitucional 19, de 1998, conhecida como reforma administrativa e incluem diplomatas e servidores de carreiras jurídicas, de auditoria e de gestão governamental, entre outras. Para incluir os engenheiros, arquitetos e engenheiros agrônomos, a proposta altera a Lei nº 5.194/66, que regula essas profissões.

 

Qualidade no ensino de Engenharia – Na opinião do presidente do Senge Bahia, engenheiro civil Ubiratan Félix Pereira dos Santos, é necessário que o governo federal pare de financiar o ensino privado com recursos públicos sem que haja controle de demanda por cursos.

“Temos que ir pra cima do governo em defesa da qualidade do ensino superior. A 18ª maior riqueza do Brasil está nas mãos de uma empresa privada de ensino que é bancada com recursos públicos do Fies e ProUni. Não dá para financiar a iniciativa privada que enriquece às custas de recursos públicos”, afirma Ubiratan Santos, que também é professor da área de engenharia no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Bahia (IFBA).

Ele cita como exemplo o excesso de oferta e a falta de demanda em determinados cursos. “Metade dos cursos de Direito do mundo estão no Brasil. Isso é uma deformação, porque não existe demanda, nem mercado que justifique esse número. Essas empresas privadas estão pegando recursos públicos e abrindo cursos que elas acham mais fácil vender, sem ligação com a demanda do nosso País. Muitas vezes são criados cursos com baixo investimento para a oferta de formação de péssima qualidade. 90% dos cursos ofertados por universidades pagas estão nas áreas de administração, direito e saúde. Os outros 10% representam o resto. O que está sendo oferecido não é necessariamente o que o nosso país precisa na formação profissional do ponto de vista estratégico. A legislação vigente é muito ruim e privilegia a livre iniciativa na educação de quem tem interesse em ganhar dinheiro. A viabilidade do negócio do ensino privado no Brasil só é possível porque o governo coloca recursos públicos à disposição dessas instituições em detrimento da expansão do ensino de qualidade para todos”, critica.

O povo como foco de atenção do governo – O presidente do Senge-RJ, Olimpio Alves dos Santos, defende a construção de políticas públicas que resultem no benefício direto para a população. “É preciso ter uma visão de futuro, sem esquecer do passado. É fundamental construir políticas públicas orientadas à verdadeira democracia que tenha o povo no centro da questão e não com arranjos para poderosos”.

Olimpio Alves dos Santos entende que os investimentos do novo governo devem garantir a infraestrutura necessária para que o país se integre de forma adequada além de induzir o processo de construção social com foco na saúde e educação. “É importante investir na formação técnica que dê suporte às cidades, de forma que tenhamos melhores espaços de convivência e não aglomerados desordenados. Este é um debate que tem que ser disseminado para toda a sociedade para que ela tenha a capacidade de construir e participar deste processo”.

 

Mobilidade e Transporte – Na opinião do engenheiro civil Rosivaldo Ribeiro Santos, presidente do Senge Sergipe, o novo governo deve ter entre as pautas prioritárias o investimento na infraestrutura multimodal de transportes, com a reativação de ferrovias e a navegação de cabotagem, bem como o financiamento de projetos de mobilidade nas grandes cidades.

“As ferrovias devem ser prioritárias para baixar o custo no transporte de mercadorias. Do ponto de vista das cidades a implantação de sistemas de metrôs é muito importante, mas não apenas quando o caos já está instalado. Infelizmente vemos hoje muitos prefeitos implantando soluções paliativas, sem projetos de futuro”.

 

Conhecimento  – O engenheiro metalúrgico João Thomaz Costa, presidente do Senge Volta Redonda, considera que o futuro governo tem que investir no fortalecimento do quadro de técnico para ampliar a geração de riquezas dentro do próprio país. “O Brasil hoje ainda é exportador de produtos primários.

Muitos especialistas brasileiros de diversas áreas que poderiam estar auxiliando no crescimento do país, acabam saindo daqui por falta de apoio. É importante que o governo fortaleça seus quadros técnicos, invista no conhecimento para que o país cresça. Outros países levam nossos profissionais, assim como compra.”

Valorização dos quadros públicos – O presidente do Senge Rondônia, engenheiro eletricista José Ezequiel Ramos, entende que o novo governo tem que garantir a valorização das empresas públicas e dos quadros técnicos, principalmente nos setores estratégicos para o desenvolvimento.

“Entendemos que o Estado deve ter o controle sobre setores estratégicos de forma que não fiquem vulneráveis a apropriações políticas ou de interesses privados. A empresa pública deve ser forte e ter quadro próprio de carreira valorizado e de qualidade para devolver à sociedade o serviço que ela espera, com a aplicação do recurso público da melhor forma possível”.

Ainda no contexto do investimento nos quadros técnicos, o presidente do Senge Pernambuco, Fernando Rodrigues de Freitas, considera que as sugestões apresentadas pelos engenheiros ao futuro governo podem servir de orientação no processo de desenvolvimento.

“Ao investir na melhoria dos quadros técnicos do Brasil o governo terá como resultado a qualidade de serviços principalmente de cunho social”.

Para o presidente do Senge Espírito Santo, engenheiro eletricista Orlando Zardo Júnior, a formação profissionalde qualidade é o primeiro passo para a construção de projetos de eficientes e de longo prazo. “Temos que formar profissionais preparados para atender às novas demandas do País. Essa formação tem que estar integrada a empresas públicas e privadas para garantir a geração de conhecimento e a inovação tecnológica. A formação, quando é localizada e respeita as diversidades, cria novas demandas de ciência e tecnologia. Temos que formar com conteúdos dirigidos aos potenciais locais”.

Passado, presente e futuro – Joseraldo Vale, engenheiro agrônomo e presidente do Sindicato dos Engenheiros Agrônomos do Rio Grande do Norte (SEA-RN), defende que o futuro governo aproveite projetos de êxito e aprenda com os erros de gestões anteriores. “Não podemos desperdiçar tempo e dinheiro para reiventar a roda. Temos que aproveitar o tempo e as inteligências com vistas ao progresso e ao bem da coletividade. É preciso que os ministérios planejem juntos e não separadamente, como caixinhas de cada partido, uns destruindo os outros”.

 

Respeito – O presidente do Senge Paraíba, Rubens Tadeu, diz que a engenharia tem que ter o seu papel respeitado nas três esferas de governo.

“Nos programas de governo hoje ouvimos falar de mobilidade, de alimentação, de infraestrutura, entre outros temas que envolvem diretamente a engenharia. A engenharia tem que ter o seu papel respeitados pelos governos”, afirma.

 

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