Ministro Silvio Almeida critica decreto do Governo que autoriza privatização da gestão de unidades prisionais e socioeducativas

O ministro Silvio Almeida, dos Direitos Humanos e da Cidadania, voltou a se pronunciar publicamente contra a privatização de unidades prisionais e socioeducativas. Em café com jornalistas hoje (02/02), em Brasília, um encontro inédito com 40 comunicadores, o ministro se colocou contra a decisão do Governo. 

“Isso não pode ser feito. Conhecemos a história: ‘Ah! Mas é só [a privatização] da estrutura [da unidade]’; ‘É só para construir o prédio. Sabemos que, no fim das contas, isso vira privatização da execução da pena, algo que não pode acontecer. E não pode acontecer não só por vontade política, mas porque é inconstitucional, ilegal’, disse o titular do ministério.

Um posicionamento mais firme por parte do ministro vinha sendo cobrado pela sociedade civil desde abril de 2023, quando o vice-presidente Geraldo Alckmin e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, assinaram o Decreto nº 11.498, tornando legal a privatização da gestão de presídios por meio de Parcerias Público Privadas – PPPs. 

Encaminhamentos oficiais

O ponto alto das declarações do ministro sobre a privatização do sistema carcerário foram as notícias sobre os encaminhamentos oficiais.

“O estudo técnico e o parecer da assessoria jurídica já estão prontos há muito tempo, e estamos debatendo [o assunto] dentro do governo”, destacou o ministro. Segundo Silvio Almeida, no entanto, ainda não houve oportunidade para tratar do tema com o presidente Lula.

“Estamos debatendo isso dentro do governo. Primeiramente, no nível político. Isso não deu certo em lugar nenhum. Abre espaço para que interesses que não são públicos se imiscuam em um lugar ultra problemático e para que agentes privados façam a execução da pena ou apliquem a medida socioeducativa,” afirmou o ministro dos Direitos Humanos e Cidadania. 

Ampliação de política de Temer

O decreto de Alckmin e Haddad, que o ministro dos Direitos Humanos busca reverter, altera legislação do governo Temer, de outubro de 2016. O texto define quais setores podem receber isenções fiscais para construção, reforma e privatização de gestão. Temer havia evitado o sistema carcerário na promulgação mas, em abril do último ano, as unidades prisionais e socioeducativas foram incluídas no decreto.

Os setores elencados também passam a ter acesso a aportes milionários da União em PPPs, via BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). O decreto aponta os investimentos considerados prioritários em setores na área de infraestrutura ou de produção econômica intensiva em pesquisa, desenvolvimento e inovação.

Em setembro do último ano, 86 entidades da sociedade civil e órgão públicos publicaram nota técnica contrária à decisão do Governo. Os especialistas e militantes pediam “o compromisso do Governo Federal de que a União não será garantidora de PPPs no sistema prisional celebradas entre empresas privadas e o Poder Público”.

Entre os signatários da nota estavam o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim), Associação Juízas e Juízes pela Democracia (AJD), Associação Nacional das Defensoras e Defensores Públicos (Anadep), o Núcleo Especializado de Situação Carcerária (Nesc) da Defensoria Pública de São Paulo, além de frentes estaduais pelo desencarceramento de 15 estados.

O cidadão e o ministro se encontram

Essa é a segunda vez que o ministro Silvio Almeida fala sobre o assunto. Em novembro do ano passado, em entrevista ao programa “Bom dia, Ministro”, o tema surgiu em pergunta enviada por alguém que acompanhava o programa naquele momento, repassada ao ministro pela entrevistadora em 30minutos e 25 segundos do vídeo da live no Youtube.

Silvio Almeida, que na época lidava com forte pressão popular, abriu a resposta destacando que falaria como cidadão, com base em posições que defendeu ao longo de sua história acadêmica, e como ministro de Direitos Humanos e Cidadania, cargo que, ressaltou, ocupa com as mesmas posições.

“A privatização de presídios não deu certo em lugar nenhum. É inaceitável porque sabemos, cientificamente, que ela redunda em violações de direitos humanos e encarceramento em massa. Como ministro, o que me cabe fazer é me posicionar institucionalmente em relação a isso. Uma vez que a questão chegou até mim – e já há reivindicações sobre posicionamentos, tanto em relação ao sistema socioeducativo quanto em relação ao sistema prisional – pedi às áreas técnicas do ministério, com base naquilo que já foi produzido tecnicamente sobre o assunto, que se manifestasse institucionalmente. Isso é o que me cabe fazer sobre essa questão”, explicou o ministro, justificando sua atuação até aquele momento.

“Como ministro de Estado, todo posicionamento tem repercussão política e isso me imbui de responsabilidade. Tudo que falo tem caráter institucional. Então, o que me coube fazer foi pedir que as áreas técnicas do ministério apresentem uma nota técnica. Essa nota, como sonho acontecer, será levada para as instâncias dentro do governo para que se trate do tema. É assim que as coisas devem ser feitas para que tenham efeito”, explicou Silvio.

De novembro a fevereiro, os planos do ministro avançaram e o debate já não é só sonho: está acontecendo dentro do Governo. O Ministério da Fazenda e Vice-Presidência da República, responsáveis pelo decreto, devem se pronunciar sobre a questão. Silvio Almeida também declarou que espera se encontrar em breve com o novo ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, para tratar do tema. Com visões bastante progressistas, Lewandowski assumiu no último dia 1/02 a pasta responsável pelo sistema carcerário brasileiro.   

 

Edição: Rodrigo Mariano/Senge RJ
Com informações da Agência Brasil, Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania e programa “Bom dia, Ministro”.
Fotos: Ascom/MDHC; Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

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